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PDGC: avaliar a qualidade faz as cooperativas crescerem

Quando se sabe onde se está e aonde é preciso chegar, fica mais fácil caminhar na direção certa.
Partindo desse princípio, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop) criou uma iniciativa cuja sigla rimada é gostosa de ser pronunciada: PDGC — Programa de Desenvolvimento da Gestão das Cooperativas. 

O objetivo do programa é ajudar a melhorar a gestão nas cooperativas brasileiras, promovendo a adoção de boas práticas de governança cooperativa. E, para lhe ajudar a entender melhor essas quatro letrinhas, vamos propor o seguinte exercício: que tal pensar na sua cooperativa como se fosse um ser humano ávido por crescimento profissionalmente? Ele já atua há algum tempo no mercado, mas percebe que poderia se destacar ainda mais se investisse em si mesmo. O problema é que não sabe direito por onde começar... É justamente aqui que começa a nossa jornada rumo ao crescimento: do incômodo de saber que se pode fazer mais.

Pois bem. O primeiro passo para crescer em qualquer aspecto — pessoal ou profissionalmente — é buscar autoconhecimento. Conhecendo-nos fica mais fácil descobrir quem somos e os nossos anseios. Estudando nossos pontos fracos, temos instrumentos para corrigi-los. Observando nossos pontos fortes, conseguimos buscar meios de aprimorá-los.

O mesmo vale para a sua cooperativa. Elas precisam se conhecer melhor para crescer. Acontece que — assim como ocorre com os seres humanos — muitas vezes é difícil fazer essa autoanálise. Enquanto pessoas precisam de psicólogos, professores e mentores para crescer, as cooperativas precisam do PDGC — iniciativa que identifica os pontos fortes e as oportunidades de melhoria do negócio, organiza todas as informações e propõe o rumo correto a seguir.

O programa segue uma metodologia criada pela Fundação Nacional da Qualidade (FNQ), que já havia elaborado diretrizes para melhorar a gestão das cooperativas antes mesmo de o PDGC surgir. O ponto de partida é a realização de uma autoavaliação completa, baseada em dois questionários voltados para os pontos principais do programa:

Assim que responde esses dois questionários, a cooperativa recebe de forma automática uma avaliação completa, que mostra:

  • os pontos fortes nos quais a cooperativa está indo bem;
  • os pontos de melhoria, com base em oportunidades que a cooperativa pode aproveitar melhor; e
  • os indicadores de desempenho que a cooperativa pode usar para medir o progresso nos pontos de melhoria apresentados.

EVOLUÇÃO CONSTANTE

Voltando ao exercício de comparar uma cooperativa a um ser humano: todos nós acumulamos conhecimentos que condizem com o estágio de nossas vidas. Na infância, as informações básicas; a juventude e suas descobertas; a idade adulta e a maturidade, coroadas com a sabedoria acumulada por anos de experiência. O PDGC também avalia as cooperativas conforme seu estágio evolutivo.

O PDGC traz exatamente isso. Se você quer subir e evoluir em relação ao caminho da excelência, você vai buscando cada vez melhores práticas, melhores processos gerenciais. É para que você tenha sua gestão ainda mais evoluída; não significa que a gestão está ruim, né?", resume a coordenadora do Núcleo de Gestão de Cooperativas do Sescoop/SP, Andrea Pinheiro, coordenadora do PDGC no estado.

O primeiro nível da escala evolutiva do PDGC é chamado de Primeiros Passos. É comum que, quando a cooperativa faça a adesão ao PDGC, esteja neste degrau.

A evolução do primeiro nível resulta no segundo, o Compromisso com a Excelência. É um estágio intermediário, quando a cooperativa passa a medir sua gestão e avaliar seus resultados. O terceiro estágio, também intermediário, mais maduro, é o Rumo à Excelência, quando o sistema de gestão e governança da cooperativa está em franca evolução e demonstra competitividade e ótimos resultados. O último estágio é o objetivo final, o avançado: a excelência.

Para acompanhar a própria evolução, as cooperativas inscritas no PDGC são convidadas a se autoavaliar, anualmente, e a implantar as sugestões de melhorias realizadas pelo Sescoop, com base no diagnóstico da cooperativa. Tem início um ciclo formado pela sigla PDCL, que significa Planejar, Fazer, Verificar e Aprender (Plan, Do, Check, Learn).

Todos os anos, novos ciclos do Programa são abertos. Desde que teve início, em 2013, estima-se que mais de 2 mil cooperativas já tenham aderido ao PDGC.


Esta matéria foi escrita por  Por Morillo Carvalho e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Dias melhores para sempre

Luz em meio à escuridão. Assim podem ser definidas as ações de impacto social que as cooperativas de todo o país têm executado em tempos tão difíceis. Quando a Covid-19 chegou tirando vidas, interrompendo sonhos, e tornando mulheres e crianças vulneráveis à violência, a ação desses grupos, em parceria com as comunidades, ajudou a iluminar a vida de milhares de brasileiros. Algumas dessas histórias foram contadas na celebração do Dia de Cooperar 2021, o nosso Dia C — movimento nacional de responsabilidade socioambiental das cooperativas brasileiras. 

Assim como em 2020, o evento deste ano foi realizado virtualmente, ao vivo, no YouTube e no Facebook do Sistema OCB. “Queríamos mostrar ao Brasil um pouco do que as cooperativas têm feito para minimizar os impactos da pandemia na vida das pessoas e na economia. Porque cooperativismo é isso: gente cuidando de gente! Além disso, queríamos celebrar o fato de nada — nem mesmo a crise pela qual estamos passando — conseguir ofuscar a paixão que nós, cooperativistas, temos pelas pessoas, e pelo nosso jeito ético e sustentável de fazer negócios”, explicou o presidente do Sistema OCB, Márcio Lopes de Freitas. 

Foi como disse a mestre de cerimônia do evento, Gisele James: estamos vivendo, sim, um momento preocupante, mas é preciso encontrar tempo para festejar as pequenas e grandes vitórias de quem está plantando o bem neste cenário de crise. E é isso que nós faremos agora, nesta reportagem. Confira!

FLORES EM VOCÊ

A pandemia do novo coronavírus obrigou o mundo inteiro a recalcular rotas, repensar comportamentos, criar caminhos diferentes. Para os integrantes da Cooperativa de Floricultores do Estado da Paraíba (Cofep), renascer da tristeza e da dificuldade não era algo novo. No fim dos anos 1990, o grupo (majoritariamente feminino) já havia surgido do caos, com o fechamento das usinas de cana-de-açúcar da região. Desemprego, desespero e alto índice de violência doméstica tomaram conta da cidade de Pilões e aquelas mulheres decidiram começar do zero, estudando sobre o cultivo de flores, que não era comum no estado. 

Mesmo sendo chamadas de loucas e sofrendo preconceito, acabaram tornando-se referência nacional na plantação de crisântemos, rosas e gérberas; ganharam prêmios, passaram a mandar suas flores para fora do Brasil. “Essa ação resultou como uma carta de alforria para as mulheres daquela região, porque a autonomia que elas adquiriram mudou tudo”, relata Karla Cristina Rocha, uma das fundadoras da Cofep.

No entanto, com a pandemia, a cooperativa, antes visitada por gente de todo o mundo, ficou novamente vazia de produção, de recursos e de esperança. “A flor está em todo momento da nossa vida, do nascer ao morrer, mas, com essa doença, não teve mais casamento, festa, comemoração, nem mesmo velório”, lamenta Maria Helena dos Santos, presidente da Cofep. “Então vimos nossas estufas vazias, perdemos todo o nosso investimento, e nada de renda chegando à nossa casa.” 

Sem fonte de renda, as mulheres retornaram para a dependência dos maridos e, consequentemente, os casos de violência doméstica voltaram a aumentar. Mais uma vez foi preciso partir do zero, e elas lembraram como são fortes. 

No meio da pandemia, nasceu a solução de mais um problema; o grupo se reuniu e teve a ideia de produzir hortaliças orgânicas, porque foi possível aproveitar toda a estrutura das estufas que anteriormente eram usadas para o cultivo das flores”, explica Karla Cristina.

A nova produção ganhou volume e devolveu a autonomia para aquelas mulheres. Hoje elas já fazem planos para conciliar a produção de hortaliças com as flores, que devem voltar em breve. “Provamos que, todo desafio que vier, a gente topa e enfrenta; mostramos para todo mundo que somos unidas, fortes, vencemos e vamos vencer mais ainda”, comemora Maria Helena.

ESPORTE DO BEM

A vulnerabilidade social do Bairro de Itararé, em Vitória  –  ES, também ficou mais evidente com a pandemia da Covid-19. E foi ali que prosperou mais uma ação cooperativista celebrada nacionalmente: crianças e jovens que sofriam com a reclusão da quarentena, sem escola, sem convívio social, receberam com um sorriso no rosto o Projeto Esporte do Bem, de iniciativa do Instituto Unimed Vitória. As aulas de basquete e futebol oferecidas gratuitamente a alunos de 7 a 14 anos, desde outubro de 2020, encheram de alegria a comunidade. 




Sheila Marinho Norberto, mãe de Gabriel Marinho, de 8 anos, conta que o filho chegou a ficar depressivo com o isolamento e só melhorou com a chegada da equipe da Unimed Vitória. “Essa oportunidade foi muito boa, vendo o momento em que a gente estava muito dentro de casa, sem poder sair por causa da pandemia, quando veio o projeto, nós ficamos muito animados”, comenta a mãe. “Eu fiz uns 100 amigos já”, conta o pequeno, empolgado e sorridente. O projeto, por enquanto, atende 110 crianças com segurança, e começa a se expandir para outras comunidades da região. A ideia é chegar a 300 alunos, quando a situação da pandemia permitir. “O Esporte do Bem é nosso catalisador. Com ele, a gente tenta potencializar a transformação social para integrar várias outras ações”, explica o diretor executivo da Unimed Vitória, Cosme Péres. Em fevereiro deste ano, por exemplo, o grupo organizou o Dia do Bem, oferecendo atendimento médico, nutricional, farmacêutico e de fisioterapia para as crianças e os adolescentes que fazem parte do projeto e seus familiares. 

COOPERAÇÃO PARA SALVAR VIDAS

Além de todos os efeitos emocionais e econômicos, a pandemia da Covid-19 trouxe altas taxas de mortes e internações, sobrecarregando ainda mais a já escassa estrutura do Sistema Único de Saúde (SUS). Assistir a esse cenário de braços cruzados não foi uma opção para os cooperados do Sicredi Ouro Verde, da cidade de Lucas do Rio Verde, em Mato Grosso. Mesmo também vivendo dificuldades por conta da crise que tomou o mundo, eles escolheram contribuir de verdade para minimizar a dor alheia.

Num movimento unificado, 95 mil associados do Sicredi abriram mão do recurso vindo de suas contribuições para auxiliar o trabalho dos profissionais de saúde da região. “Vimos que muitos irmãos nossos estavam sem saber o que fazer diante de tanta dificuldade e procuramos especialistas na área para mostrar do que precisavam mais”, relata o presidente da cooperativa, Eledir Pedro Techio. “Entendemos que, se nós salvássemos uma vida, já teria valido a pena o nosso investimento.” 

Assim, o grupo criou o Cooperação para salvar vidas e conseguiu doar R$ 5 milhões para a compra de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e aparelhos para as Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) de hospitais que atendiam pacientes com Covid. Além da própria contribuição, a cooperativa ainda incentivou a comunidade a complementar o auxílio.“Essas ações, sem dúvida alguma, contribuíram com o salvamento de muita gente; podemos dizer que somos corresponsáveis pelas mais de 400 mil vidas recuperadas no nosso estado”, comemora a presidente do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM-MT), Lucia Helena Sampaio, com a voz embargada.

Estranho seria a gente não se emocionar falando de toda essa nossa trajetória no enfrentamento à Covid”, acrescenta Gabriela Refatti, diretora do Hospital São Lucas, um dos atendidos pelo projeto. Com a ajuda dos cooperados e da comunidade, a unidade de saúde conseguiu abrir mais 30 leitos de UTI. “Quando a pandemia nos pegou de frente, nos sentimos muito desamparados, mas, ao receber ações como essa que teve o Sicredi, como uma mão amiga segurando a instituição, a gente conseguiu ao menos vislumbrar uma certa tranquilidade nesses momentos delicados”, complementa a diretora.

DIGNIDADE PARA TODOS

Sintonizadas com o Dia C, as cooperativas atuam também para melhorar o ambiente em que vivem tantas pessoas em regiões vulneráveis. Assim, surgem projetos de sustentabilidade, como o da Unimed Belém, que atua pelo desenvolvimento da região de Marajó, no Pará. Este ano, o trabalho do grupo foi direcionado à comunidade ribeirinha da Vila do Palheta, que vive do extrativismo vegetal, da pesca e da caça, e que quase não tem acesso a serviços públicos, principalmente de saúde.

A ação da cooperativa tem sido voltada para o saneamento básico, com a implantação de 44 banheiros ecológicos para os 140 moradores locais. “Depois de fazer uma visita técnica para ver a situação real da comunidade, nós percebemos que a região era vítima de muito descaso por parte do poder público”, argumenta Eduardo Abrahão, assessor de sustentabilidade da Unimed Belém.

A assessora de Promoção Social do Sistema OCB/PA, coordenadora do Dia C no estado e articuladora do projeto, Flávia Gil, destaca o impacto direto para a população. “O principal é perceber como a semente do cooperativismo pode transformar a realidade e trazer sustentabilidade, pois essa ação vai ter resultado não só para a geração de agora, mas também para as próximas”, comenta.

PLANETA ÁGUA

No Paraná, o Projeto Nossa Água também leva a visão sustentável a comunidades vulneráveis. Coordenada pela Cooperativa Agroindustrial Integrada, a ação tem origem e foco na preocupação com a finitude dos recursos hídricos da Terra. 

As atividades de conscientização ambiental existem desde 2006, mas, com o tempo, o grupo tem atuado também em outras frentes, como o repovoamento de rios e a recuperação de nascentes. Nesses 15 anos, já foram plantadas mais de 1 milhão de mudas pelo projeto. “Acreditamos que o desenvolvimento sustentável inicia hoje para que as futuras gerações possam também usufruir dos recursos naturais”, explica a coordenadora de sustentabilidade da cooperativa, Ana Lúcia Almeida.

E já é possível colher os frutos desse empenho ao observar a fala articulada da estudante Amanda Salvetti, de 16 anos, que participa do projeto desde bebê. “Eu tive o privilégio de receber essas informações organizadamente quando criança e agora eu consigo visualizar os benefícios”, conta a jovem. “Nós temos hoje um ar mais puro, uma vegetação deslumbrante, paisagens que são fenomenais, e eu acredito que, se cuidarmos do nosso presente, as próximas gerações poderão usufruir mais ainda do contato com a natureza.”  

DOANDO ENERGIA

Cuidar do planeta utilizando os princípios do cooperativismo tem sido o lema do Sistema Ocemg na execução do Programa de Energia Fotovoltaica do Cooperativismo Mineiro (MinasCoop Energia). O projeto, lançado neste ano, incentiva as cooperativas de Minas Gerais a construírem usinas de energia limpa e autossuficiente e a doarem parte da produção para unidades de saúde do estado. 

Uma das beneficiadas pelo programa será a Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, que gasta, mensalmente, R$ 100 mil com as contas de energia e poderá economizar mais de R$ 1 milhão por ano quando a doação da usina chegar, ainda em 2021.

Nós sabemos que esse hospital vive com dificuldades imensas, e sempre pensamos em ajudá-los e fazer disso um processo para que possa ter impacto do ponto de vista ambiental, econômico e social”, comenta Garibalde Mortoza Jr, presidente do Sicoob Credicom, que também integra a ação.

O presidente do Sistema Ocemg e um dos idealizadores do Dia C, Ronaldo Scucato, comenta que a expectativa sobre o MinasCoop Energia é grande pelo potencial de reprodução da ideia no restante do país. “Já temos a confiança e a participação de quase 20 cooperativas, e contamos com todas para que essa iniciativa também se torne um grande exemplo de como o cooperativismo promove transformações”, conclui.

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QUAL É A MÚSICA?

Uma das principais atrações do Dia C 2021 foi a trilha sonora. As cooperativas que tiveram suas histórias contadas no evento ganharam uma música especial, cantada pela banda CONECTA — formada por músicos de Brasília que, assim como as nossas coops, viveram a superação da pandemia.  Olha que maravilha a seleção:

Cooperativa: Unimed Vitória (ES)

Música: Sementes do Amanhã, Gonzaguinha

Trecho

“Ontem o menino que brincava me falou
Que o hoje é semente do amanhã
Para não ter medo, que esse tempo vai passar
Não se desespere não, nem pare de sonhar”

Cooperativa: Unimed Belém (PA)

Música: Sal da Terra, Beto Guedes

Trecho

“Um mais um é sempre mais que dois
Para melhor construir a vida nova
É só repartir melhor o pão
Recriar o paraíso agora
Para merecer quem vem depois”

Cooperativa: Cooperativa dos Floricultores do Estado da Paraíba 

Música: Anunciação, Alceu Valença

Trecho

“Na bruma leve das paixões que vêm de dentro
Tu vens chegando pra brincar no meu quintal
No teu cavalo
Peito nu, cabelo ao vento
E o sol quarando nossas roupas no varal”

Cooperativa: Cooperativa Integrada (PR)

Música: Planeta Água, Guilherme Arantes

Trecho:

“Águas escuras dos rios
Que levam a fertilidade ao sertão
Águas que banham aldeias
E matam a sede da população”

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DIA C EM NÚMEROS

+ de 20 milhões de pessoas 

foram impactadas pelas ações de responsabilidade social do Dia C desde o lançamento do programa, há 12 anos

+ de 11 mil projetos 

realizados nesse período

1 em cada 4 municípios brasileiros 

é beneficiado por programas de responsabilidade social promovidos por cooperativas

SOMENTE EM 2021...

1.295 iniciativas previstas

1.277 voluntários 

133 mil pessoas beneficiadas


Esta matéria foi escrita por Por Adriana Caitano e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Conexão inovadora

Trazer o novo à tona requer muito mais do que talento, disposição e recursos. Gerar ideias, criar soluções inovadoras para os dilemas de qualquer tipo de negócio, passa inevitavelmente pelo compartilhamento de informações, conhecimento e experiências, ou seja, inovar é também um processo de cooperação. 

Pensando nisso, o Sistema OCB lançou o Programa InovaCoop Conexão com Startups, em parceria com a Innoscience — consultoria especializada em inovação corporativa. A iniciativa pretende encontrar startups que possam solucionar os desafios que foram selecionados e são enfrentados atualmente pelo cooperativismo, estimulando a parceria entre elas e as nossas cooperativas.

“Inovação não é feita por uma pessoa sozinha; ninguém inova sozinho, sentado da sua cadeira. Ela é feita no coletivo e, se possível, com bastante diversidade de pensamento, de bagagem cultural, racial, regional, porque só enriquece os processos e faz mais ideias diferentes circularem, e novas ideias surgem. O InovaCoop Conexão com Startups está focado na inovação aberta1, com objetivo de olhar para fora e trazer as startups para resolverem  os desafios do cooperativismo”, destaca Samara Araujo, coordenadora do Núcleo de Inovação da OCB.

Na prática, o programa foi desenhado para reunir desafios compartilhados por várias cooperativas, para que a solução encontrada possa beneficiar o maior número possível delas. Por isso, o principal critério de inscrição foi a apresentação de um problema comum ou similar às necessidades de pelo menos cinco cooperativas. 

Do total de 30 inscrições recebidas, foram selecionados nove desafios de cooperativas e um do próprio Sistema OCB. Entre os escolhidos, estão o desenvolvimento de: tecnologia para planos de saúde; aplicativos de serviços; gestão de dados; pesquisa de satisfação e relacionamento; e rastreabilidade da informação. 

Integram o grupo selecionado cooperativas dos ramos de Saúde, Transporte, Trabalho, Agro, Energia e Crédito sediadas em estados das regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do país. Muitos desses desafios têm potencial para escalar e suas soluções podem servir para cooperativas de outras regiões.

“É um modelo que se agrega e consegue dar uma estrutura para que as cooperativas consigam participar e solucionar problemas que, às vezes, são dores de diferentes cooperativas. Então, ter a capacidade de chegar a mais pessoas, a mais cooperados e a mais estados é um papel importante que as cooperativas têm nesse processo de dar mais visibilidade e se introduzir nesse mundo da inovação, trazendo isso para os cooperados lá na ponta”, destaca a head de inovação da Innoscience, Julia Mariné.

DIFERENCIAL COMPETITIVO  

Um dos desafios selecionados pelo InovaCoop Conexão com Startups com potencial para resolver os problemas de um setor inteiro é da Federação das Cooperativas de Trabalho do Rio Grande do Sul (Fetrabalho), em parceria com a Cooperativa de Trabalho, Produção e Comercialização dos Trabalhadores Autônomos das Vilas de Porto Alegre (Cootravipa); a Cooperativa de Trabalho Educacional Cooperconcórdia (Cooperconcórdia); a Cooperativa de Trabalho dos Profissionais Liberais do Brasil (Cooplib), e a Cooperativa de Transporte de Produtos Líquidos (Cooper Líquidos).

Esse grupo pretende disponibilizar ao público todo o portfólio de serviços das cooperativas em uma única plataforma. O objetivo é facilitar — por meio de aplicativo ou outro espaço de whitelabel2 e marketplace3 — a oferta dos serviços prestados pelo cooperativismo. 

Segundo a presidente da Fetrabalho, Margaret Cunha, a criação de uma plataforma única no Ramo do Trabalho é um desafio que já se arrasta há alguns anos, ampliado durante a pandemia. Com as medidas de isolamento social, muitas cooperativas tiveram dificuldades para expor seus serviços e tiveram que se readaptar para manter os clientes. 

“Estou muito feliz por termos sido selecionados, e mais ainda por representar a Região Sul. Somos um sistema, temos uma divisão de ramos, mas temos de nos ajudar entre nós. É uma realização finalmente concretizar um sonho que já vem há mais de três anos e não tínhamos condições de fazer sozinhos. Se as cooperativas não abraçassem essa ideia, não teria como formatar”, relata Margaret.

O desafio apresentado pela Fetrabalho e por afiliadas consiste na construção de uma plataforma B2C — modelo caracterizado pela venda de um produto ou serviço da empresa diretamente para o consumidor final. As cooperativas integrantes do aplicativo poderão expor seus serviços aos clientes de forma conjunta e ter melhor remuneração em relação a modelos tradicionais, já que serão proprietárias da plataforma e poderão exercer a governança sobre os investimentos. 

O grupo brasileiro se inspirou em um projeto desenvolvido por um grupo de cooperativas de trabalho sediadas nos Estados Unidos e tem por meta inserir as coops envolvidas na chamada economia de plataforma4. Além disso, o desenvolvimento desta solução será escalável para cooperativas de trabalho de outras regiões do país. 

A expectativa é que a plataforma dê mais visibilidade aos trabalhos prestados não somente para o consumidor final, mas também para beneficiar outras cooperativas.  “Acho que o aplicativo vai servir para que as cooperativas se enxerguem no mercado. Tem atividades que são importantes para o setor público e para os clientes, mas é importante que as cooperativas olhem para dentro e vejam a gama de serviços que podem ser contratados no próprio cooperativismo”, destaca Margaret.

SEGURANÇA JURÍDICA

Essa é a primeira vez que a Federação busca aproximação com startups. A entidade projeta um aumento de 20% no volume de negócios a partir das potenciais parcerias que poderão resultar do programa. A presidente ressalta, no entanto, que “cada produto novo tem um tempo de maturidade” e que o grupo pretende alcançar os resultados de forma gradual, “com tranquilidade e segurança jurídica”.

“O pessoal das startups é jovem, com ideias, olhares diferentes que vão poder nos ensinar. A gente quer entrar com eles nesse mundo para evoluir e trazer para dentro das cooperativas a inovação, a tecnologia. O mercado mudou e precisamos nos adaptar; ver o que está surgindo de novo e as possibilidades de sermos inseridos” complementa Margaret.

Para lançar o desafio, o grupo contou com o apoio da unidade estadual do Sistema OCB no Rio Grande do Sul, o Sistema Ocergs, que, por meio da Faculdade de Tecnologia do Cooperativismo (Escoop), está desenvolvendo o projeto de pesquisa “Cooperativas de Plataforma e Ambiente Jurídico”. Segundo o coordenador do projeto e Diretor-Geral da Escoop, Mário de Conto, a pesquisa aponta a intercooperação como uma das alternativas para a implementação de plataformas cooperativas.

“Nesse caso, a análise de modelos internacionais que realizamos serviu como base ao desafio, que permitirá que cooperativas de trabalho brasileiras ingressem na Economia de Plataforma, de forma que a propriedade e a gestão sejam de seus próprios associados”, comentou De Conto.

O pesquisador também reforça que o programa da OCB contribuirá para o fortalecimento da cultura de inovação no meio cooperativista. “Como pesquisador e entusiasta da Inovação no Cooperativismo, entendo que iniciativas como o Programa InovaCoop Conexão com Startups  são fundamentais para a disseminação da cultura da inovação e a implementação de iniciativas inovadoras no cooperativismo brasileiro”, comentou o diretor da Escoop.

GERAÇÃO DE NEGÓCIOS

Passada a fase de encontrar os problemas, o programa da OCB se debruça na missão de atrair startups interessadas em resolver as dores apontadas pelas cooperativas. Serão em torno de dois meses para receber as inscrições e conhecer as propostas dessas empresas.

O processo de triagem será feito pelas cooperativas e finalizado no Pitch Day — evento on-line para o qual avançarão de uma a três startups para cada desafio. O objetivo do evento é filtrar apenas uma startup para cada missão.

“É o dia do match (conexão), em que as startups se apresentam para as cooperativas como potenciais resolvedoras daqueles desafios”, explica Samara Araújo.

Desse momento em diante, aumenta a aproximação das cooperativas com as startups. No processo de conexão e imersão, os desafios começam a ser lapidados aos poucos rumo à solução. É definido um escopo de ação e firma-se um acordo para o desenvolvimento de um projeto piloto.5

“O primeiro resultado esperado é o impacto cultural da inovação no setor, no ambiente do cooperativismo. Abrir os olhos, se aproximar dessa nova forma de ver as coisas, se relacionar, não precisa fazer tudo do zero sozinho. Afinal, dá para contar com empresas mais jovens e focadas para trazer conhecimento e novas formas de trabalhar”, comenta Julia Mariné, da Innoscience.

A consultora também destaca a troca que ocorre entre o que uma startup pode entregar para uma cooperativa, e vice-versa. “As cooperativas do programa têm mais recursos financeiros, mais experiência em gestão, um negócio mais maduro; já as startups estão iniciando, têm uma forma de pensar mais flexível, mais rápida. No fim das contas, essa relação é de ganha-ganha, o processo costuma ser bem proveitoso para ambos os lados”, completa.

Mas o maior impacto almejado, tanto pelas startups quanto pelas cooperativas, é a geração de negócios, com redução de custos, aumento de produtividade, eficiência e faturamento. Por isso, o programa foi todo estruturado para proporcionar que, ao final, a startup possa se tornar uma fornecedora ou parceira das cooperativas envolvidas naquele desafio. 

“No mercado em geral, temos uma taxa de conversão de pilotos em negócio por volta de 10% a 15%. Com a nossa metodologia, cerca de 70% dos projetos desenhados são executados. Desses, por volta de 45% são contratados no final. Essa é a média dos mais de 300 pilotos que já desenvolvemos com as empresas”, destaca a consultora.

BONS FRUTOS

Essa é a primeira edição do programa realizado em parceria com a OCB, e a expectativa é de que as cooperativas cheguem ao fim do programa, previsto para fevereiro de 2022, com novo mindset (modo de pensar) e, principalmente, novos parceiros de negócios.

Algumas cooperativas já participaram de programa similar com a Innoscience e ainda colhem os frutos da parceria firmada com startups. É o caso da Unimed Vales do Taquari e Rio Pardo (VTRP), que atualmente tem parceria com nove startups, todas firmadas durante o programa de conexão. 

A cooperativa de saúde lançou seus desafios por meio do Projeto Innovation Unimed, desenvolvido com a Innoscience para selecionar startups de todo o Brasil que possam resolver diferentes problemas do Ramo Saúde. O projeto teve início em 2019 e já está na terceira edição. 


Entre os desafios lançados este ano pela Unimed VTRP, estão: 

  • acompanhamento, em tempo real, das solicitações dos clientes; 
  • gestão on-line da comercialização; 
  • inteligência na análise de laudos e exames;
  • tecnologias vestíveis para monitoramento da saúde dos clientes; 
  • soluções digitais em saúde; remuneração por performance de colaboradores; 
  • inteligência de dados para geração de oportunidades; e 
  • inovações na saúde.

Na primeira edição do Innovation, cinco startups fecharam negócio. Uma delas permitiu o desenvolvimento da telemedicina, antes mesmo da pandemia — o que levou a cooperativa ao pioneirismo nesse tipo de atendimento. A solução altamente escalável foi adotada por várias cooperativas da região e de outros estados.

Outro negócio fechado que rendeu bons frutos permitiu a otimização do contato com clientes inadimplentes — demanda que também cresceu muito durante a crise do coronavírus. E uma das soluções mais recentes desenvolvida por startup e utilizada atualmente pela Unimed é a Robô Laura, que auxilia, por meio de inteligência virtual, no pronto atendimento virtual de pacientes com sintomas gripais e de dengue. 

A cooperativa lançou ainda um hub de inovação que tem dois programas de aceleração e mentoria de startups com soluções em saúde. “Os maiores resultados não são mensuráveis. A solução em si é o maior ganho. Hoje temos maior agilidade nos processos, escalabilidade nas soluções e atingimos um ganho de marca enorme”, comenta a superintendente executiva Rosilene Knebel.

Segundo a superintendente, em 2020, 42% dos investimentos feitos pela Unimed VTRP foram para projetos de inovação. Em 2021, até o mês de julho, o percentual investido em inovação chegou a 24%. O volume investido e os resultados alcançados renderam à Unimed VTRP o título de cooperativa mais inovadora do ramo e da região. 

NA ORIGEM

A experiência da Unimed VTRP com startups foi inspirada na ação do Sicredi, que participou do programa da Innoscience em 2018 e 2019. Entre os desafios do Sicredi naquele momento estava iniciar o processo de transformação digital de seus processos e serviços.

“Esse programa de conexão de startups foi um dos primeiros movimentos da nossa transformação digital. Sabendo de todas as nossas dores internas, naquele momento a gente entendeu que uma das alternativas era se aproximar do ecossistema de startups, entender o modo como elas funcionavam, sua capacidade de adaptação, de aprender coisas novas todos os dias, para buscar soluções para o nosso negócio, entregando valor para o nosso associado”, conta Rodrigo Murari, especialista de Inovação do Centro Administrativo do Sicredi.

Inicialmente, os desafios lançados pelo Sicredi eram relacionados a questões internas, mais administrativas. Na primeira edição do programa, a cooperativa fechou negócio com cinco startups, de nove experimentos analisados; n. E na segunda edição, de onze pilotos, foram fechadas três conexões com startups

Hoje, o Sicredi tem estratégia própria de inovação com o já conhecido Programa Inovar Juntos e integra o AgTech Garage — considerado um dos maiores hubs de inovação focado no agronegócio da América Latina. A cooperativa parte também do hub de inovação do Instituto Caldeira, em Porto Alegre. 

“Foi com os bons aprendizados no programa que a gente passou a ter capacidade para aprender e experimentar sozinhos. Paramos de fazer eventos e passamos a disponibilizar o modelo como uma ferramenta customizada para as diferentes áreas de negócio da empresa, sob demanda dos times”, explica Murari.

Desde o início da jornada com as startups, em 2018, algumas conexões entre o Sicredi e essas empresas foram concluídas com sucesso, e outras continuam até hoje. Uma delas viabilizou a análise de perfil do associado no Sicredi Mob. A funcionalidade foi lançada em fevereiro do ano passado, antes da pandemia, e já atraiu muitos associados que tinham investimentos em outras instituições financeiras. Desde o início da parceria, a cooperativa já contabilizou mais de R$ 150 milhões transacionados por meio dessa funcionalidade.

A conexão com startups também rendeu otimização de processos internos, inclusive incluindo na área jurídica, que tem cláusulas bem rígidas. Ainda na área administrativa, o desafio de alcançar maior eficiência no registro de despesas com viagens de colaboradores do Sicredi foi solucionado pela startup Paytrack. A parceria tem rendido ao Sicredi em torno de R$ 1 milhão em economia por ano, sem contar os ganhos de uma experiência mais simplificada para o colaborador. 

“Antes, era feito tudo por e-mail e um sistema de requisição. Levava dias para ter o ressarcimento das despesas com hotel, passagem aérea, alimentação. Tinha inconsistências nos dados e era um trabalho bem moroso para ambas as partes, tanto para o colaborador, quanto para o time responsável. AE a Paytrack automatizou e digitalizou todo esse processo”, conta Rodrigo Murari.

A Paytrack está com a cooperativa desde a primeira edição do programa de conexão. E, como a relação é de ganha-ganha, a startup também relata os bons frutos que já colheu depois da aproximação com o cooperativismo. 

“Esses programas são oportunidade para as empresas que estão começando e querem se aproximar de grandes corporações. É quando as empresas estão abertas para algo novo ou têem necessidade de mudar algum processo”, disse Daniele Amaro, CEO da Paytrack.

Daniele reforça que o desafio das despesas e viagens corporativas trouxe melhor visão de produto, e que a parceria permitiu o desenvolvimento dos negócios da startup. Atualmente, o Sicredi é o terceiro maior cliente da Paytrack e cerca de 5% do faturamento total da empresa resultam do contrato com a cooperativa.

“Além de novas funcionalidades de produtos, o aprendizado está associado ao desafio de levar nossa tecnologia para inúmeras cooperativas na ponta, com suas próprias especificidades. Pretendemos criar novos produtos e serviços juntos, alinhados à gestão e ao pagamento de despesas corporativas.”, completa Daniele.

Para conhecer melhor o Projeto Conexão com Startup, assista ao vídeo que preparamos especialmente para você.

1 A inovação aberta é aquela realizada de forma colaborativa, com o envolvimento não apenas dos profissionais de uma empresa, mas de agentes externos, como clientes, fornecedores, institutos de pesquisa, órgãos públicos, startups e outras organizações.

2 Modelo de negócio no qual uma plataforma ou um serviço desenvolvido por uma empresa é revendido por outras empresas sem divulgação dos direitos autorais, ou seja, como se a inteligência por trás do produto fosse da marca que o revende.

3 plataforma de vendas que reúne produtos de diversos fornecedores em um mesmo local. 

4 Modelo econômico baseado em plataformas digitais, ou seja, em  ferramentas ou softwares disponibilizados na internet. A maioria delas funciona como um negócio colaborativo, onde, graças à participação massiva de usuários ou conexão de rede, um produto ou serviço é  trocado, comprado, vendido, alugado ou acessado. Entre as principais plataformas que hoje movimentam a economia estão a Uber, o IFoods e o Airbnb.

5 O MVP é a versão mais simples e enxuta de um produto ou serviço. A lógica é entregar a principal proposta de valor idealizada com o mínimo possível de recursos

Um novo tempo

“As transformações digitais tão necessárias para o mundo dos negócios dependem mais do comportamento humano do que das máquinas.” A avaliação é de José Salibi Neto, um dos maiores especialistas do Brasil e do mundo quando o assunto é gestão. 

Salibi sabe como ninguém o que as empresas e os profissionais precisam fazer para atingirem suas melhores performances. E acredita que, nestes novos tempos, mais do que investir em tecnologia, é necessário incentivar a mudança de mentalidade —– tanto de gestores quanto de funcionários. 

Profundo estudioso do tema, ele se dedica há anos e com afinco a compartilhar todo o seu conhecimento e colaborar para o sucesso das organizações. Aprendiz e amigo de Peter Druker — um dos gurus da administração e gestão —, Salib é pesquisador, palestrante, empreendedor, autor de livros e professor. 

Além disso, é um dos criadores da HSM, uma das maiores empresas do país no segmento de educação executiva. Trabalhou por lá cerca de 30 anos até resolver alçar novos voos profissionais.

Debruçou-se, então, a estudar as transformações que estão surgindo com as novas tecnologias e como isso tem impactado os profissionais, as organizações e os próprios modelos de gestão e de negócios. Desses estudos e de toda a sua trajetória trabalhando com os maiores pensadores do tema e líderes mundiais, surgiram importantes livros.

Com Sandro Magaldi, escreveu a Tríade da Gestão Exponencial, que é composta por três obras: Gestão do Amanhã, o Novo Código da Cultura e Estratégia Adaptativa: O novo tratado do pensamento estratégico, que foi publicado no fim de 2020. 

Nesse último livro, os autores desenvolveram o conceito de “estratégia adaptativa”, um modelo de gestão mais alinhado com os novos tempos, em que é preciso trabalhar com dados, agilidade e cultura, tendo o cliente como foco. O objetivo da obra é auxiliar as empresas a se adaptarem a estsa nova era, inovarem e se manterem competitivas.

Nesta entrevista para a Revista Saber Cooperar, José Salibi Neto aborda esse novo modelo estratégico essencial às empresas —, as transformações digitais —, compartilha suas impressões sobre o momento que estamos vivendo e mostra, de maneira bem sincera e construtiva, como as cooperativas podem aplicar todos esses conhecimentos à sua realidade. Confira:

Saber Cooperar: Você poderia começar contando um pouco mais sobre seu novo livro? Como ele surgiu?

José Salibi Neto: A origem de tudo foi o nosso livro Gestão do Amanhã, um manifesto que mostra o ambiente em que estamos vivendo e como a tecnologia está transformando a gestão. Lançamos o livro há uns três anos e meio. E depois nós percebemos, pesquisando mais, que, se as empresas não criassem o ambiente correto, se não tivessem a cultura correta, não conseguiriam fazer as transformações digitais. Percebemos que o digital tem mais a ver com comportamento do que com máquina. E com isso a gente acaba jogando com a ideia de uma nova maneira de pensar a estratégia. 

Saber Cooperar: Então, a estratégia está mudando ao longo do tempo?

Salibi Neto: A estratégia se divide em três grandes blocos. O primeiro bloco, que vai da Primeira Revolução Industrial até o fim dos anos 1970, é o bloco da Era das Operações. Do começo dos anos 1980, quando tivemos o advento da globalização, até os anos 2000, tivemos a Era da Competição, onde o foco era o competidor. Depois, a partir dos anos 2000, a tecnologia pega uma tração muito grande e derruba barreiras.

Saber Cooperar: E qual é o diferencial deste bloco que estamos vivendo?

Salibi Neto: Nele, a única chance de ter sucesso é focando no cliente e colocando-o ele no centro. Logicamente, rodeado por dados; por uma inovação constante, uma vez que os ciclos dos produtos e serviços estão ficando cada vez mais curtos e os sistemas, mais ágeis; e uma cultura [organizacional] que impulsione tudo isso.

Saber Cooperar: De onde “beberam” para desenvolverem esse conceito de Estratégia Adaptativa?

Salibi Neto: Esse modelo é uma evolução do modelo do professor Michael Porter, o pai da estratégia competitiva. Agora, chamamos de Estratégia Adaptativa para mostrar uma nova maneira de pensar em um mundo dirigido pela tecnologia.

Saber Cooperar: Qual é o grande diferencial deste momento que estamos vivendo?

Salibi Neto: A partir do momento em que a tecnologia pega tração nos anos 2000, em que vimos a ascensão da computação em nuvem, streaming e um mundo cada vez mais digital, o cliente toma um novo poder. Ele fica completamente empoderado.  Antes, as empresas que focavam na competição, procuravam criar barreiras para que ninguém entrasse. Um exemplo são os bancos: eles criavam milhares de agências;, então, era praticamente impossível começar um banco. De repente, vem a tecnologia, que começa a crescer exponencialmente, e surge um banco como o Nubank, que tem 40 milhões de clientes e nenhuma agência. Entramos nessa era do empoderamento do cliente, onde, obviamente, é importante olhar para a concorrência, mas o foco é resolver os problemas, as necessidades e demandas dos clientes.

Saber Cooperar: Então não basta as organizações investirem em tecnologia, certo?

Salibi Neto: Com certeza, não. Qualquer empresa que tem dinheiro compra tecnologia. É o exemplo que sempre dou: as operadoras que colocam seus robôs para ligar para mim e para milhões de brasileiros estão usando a tecnologia, mas estão usando de maneira errada. Não adianta nada ter tecnologia se não tiver os comportamentos certos e souber potencializar essas tecnologias para que elas joguem ao seu lado, e não contra você.

Saber Cooperar: Quais têm sido os principais empecilhos para a maioria das empresas nestes novos tempos?

Salibi Neto: O maior empecilho tem sido a cultura organizacional. Essa cultura é formada por comportamentos, artefatos, crenças, pressupostos, normas. A cultura de uma empresa é o jeito que ela faz as coisas. 

Saber Cooperar: E como é possível conseguir essas transformações?

Salibi Neto: Primeiro, é importante lembrar que nós temos dois tipos de empresas: as startups, que são empresas novas, que estão aproveitando as tecnologias para resolver problemas que não eram resolvidos pelas empresas tradicionais; e temos as empresas tradicionais, que nasceram em um mundo voltado para a concorrência, em que clientes eram importantes, mas não eram prioridade. Para mudar isso, tem que mudar o comportamento da empresa. 

Saber Cooperar: Existe resistência? Medo? Conservadorismo?

Salibi Neto: Todo mundo já entendeu que precisa mudar. Mas não sabem como, o. Ou fazem de uma maneira equivocada. Muitas acham que é só tecnologia, comprar inteligência artificial e robôs, ou seja, não é só tecnologia, é preciso mudar pessoas. Só que mudar pessoas dá muito trabalho. Para conseguir mudar comportamentos de uma empresa tradicional grande, leva, no mínimo, três anos.

Saber Cooperar: Pode dar exemplo de uma empresa que tem conseguido fazer isso bem?

Salibi Neto: São poucas. Um dos exemplos é a Magazine Luiza. Ela era uma empresa varejista que só vendia produtos, e hoje é uma plataforma digital, centrada no cliente, que está sempre inovando. É um típico exemplo dao Estratégia Adaptativa. Então, pPara operar nesse mundo, você precisa mexer em várias coisas: na cultura, nos dados, em sistemas ágeis.

Saber Cooperar: Arriscar é preciso?

Salibi Neto: Antes, na cultura de eficiência, as pessoas não podiam errar. Se elas errassem, eram crucificadas. Agora, a gente não consegue inovação se as pessoas não se arriscarem, se não tentarem e errarem. O erro, no sentido de tentar coisas, é muito importante.

Saber Cooperar: Acredita que os profissionais do mercado estão prontos para isso?

Salibi Neto: Eu vi uma pesquisa recentemente dizendo que somente 2% dos colaboradores de uma empresa tradicional estão preparados para mudar em um mundo digital como conhecemos. É necessário desenvolver a competência digital dos colaboradores. É fundamental! Porque senão as empresas não conseguirão se adaptar.

Saber Cooperar: Qual é a habilidade profissional mais relevante nestse momento?

Salibi Neto: As habilidades necessárias evoluíram. As habilidades antigas —– como saber liderar pessoas, trabalhar em equipe, criar ambientes colaborativos —– são importantes; mas hoje temos outras habilidades. Uma delas é saber conectar as pontas. Hoje temos um universo grande de habilidades e tecnologias, e todas estão se convergindo. Antes, você mandava o cara da Tecnologia da Informação para resolver isso, mas hoje, se o líder não souber fazer essas conexões, acabam sendo engolidos. 

Saber Cooperar: E quanto às cooperativas? Quais mudanças são essenciais para que elas façam frente a todas essas transformações de maneira competitiva?

Salibi Neto: Acho que é necessária uma revisão na governança do sistema cooperativista, que é um sistema de muito sucesso. Admiro o sistema cooperativista porque acho que é a maneira de um país como o Brasil se desenvolver. Mas o sistema cooperativista precisa abraçar novas ideias, gestão de dados, tecnologia e transformar cultura. A cultura cooperativista também é uma cultura forte que não foi readaptada para o tempo que vivemos. Então, é importante uma série de revisões, já que o mundo das startups não tem piedade: a hora que ele vê uma lacuna em algum lugar, ele vai lá com uma solução tecnológica e passa por cima.

Saber Cooperar: Como isso pode ser feito?

Salibi Neto: As cooperativas, agora, têm um senso de urgência. Elas precisam que seus líderes, em cima, se juntem, vejam o que é preciso mudar, e até mesmo se é preciso mudar pessoas; e ir cascateando isso para baixo, para as outras cooperativas. Podem criar centros de inovação, labs (laboratórios) e fazer auditoria na questão cultural para ver quais pessoas têm a propensão de abraçar essas questões, que tipo de tratamento vai ser feito. É necessária uma revisão para que o cooperativismo possa crescer nos próximos 100 anos. Se continuar operando como sempre operou, está sim em uma situação muito vulnerável.

Saber Cooperar: Essas iniciativas da OCB quanto à inovação e capacitação dos cooperados são fatores positivos?

Salibi Neto: Com certeza. Eu sou um dos fundadores da HSM e, nos eventos que nós fizemos durante todos esses anos, percebemos o mundo cooperativista sempre muito presente. É uma comunidade que tem uma aprendizagem na veia. Por exemplo, o mundo varejista aprendeu pouco e, por isso, tem tantas empresas se perdendo. Já o mundo cooperativista é um mundo que estuda, aprende.

Saber Cooperar: A gestão colaborativa pode ser um ponto positivo das cooperativas nestses novos tempos?

Salibi Neto: Certamente. Mas vejo muita cooperação entre uma cooperativa e os seus cooperados, e sinto que não existe grande cooperação entre as próprias cooperativas. A gente vê uma cidade com um monte de cooperativas, cada um fazendo a sua parte, mas sem muita união. Esse conceito de colaboração também precisa existir entre as cooperativas.

Saber Cooperar: E qual é a importância de estar atento às tendências do mercado e às próprias iniciativas desenvolvidas por startups?

Salibi Neto: As cooperativas precisam rever sua própria missão para aproveitar as possibilidades do mundo voltadas para a tecnologia e para criar mais valor para os seus cooperados. Assim, recomendo que o mundo cooperativista vá lá, por exemplo, no Luiza Labs [laboratório de Tecnologia e Inovação do Magazine Luiza] para ver como eles fizeram. Uma empresa de quase 70 anos, que há seis anos ninguém acreditava mais nela. Agora, seis anos depois, está valendo mais que o Bradesco. Eles abraçaram a causa e mudaram. 

Saber Cooperar: A cultura de dados também é importante nesse contexto?

Salibi Neto: Dado hoje é o novo petróleo. É você ter o comportamento do cliente através da tecnologia para criar produtos e serviços mais voltados para ele. Quando ligo a Netflix, o algoritmo está falando comigo o tempo todo e vendo como estou me comportando. E, a partir disso, ele faz recomendações. Os dados das cooperativas têm que ser da mesma maneira: trazer os comportamentos dos clientes para possibilitar o desenvolvimento de produtos e serviços que façam sentido.

Saber Cooperar: O que você recomendaria para os cooperados que querem começar a entender melhor sobre todas essas mudanças?

Salibi Neto: Não é querendo vender meus livros, mas eu e meu sócio, Sandro, nos dedicamos a vida inteira a criar ferramentas de gestão que ajudem as empresas estabelecidas neste mundo, começando pelo mindset, pela cultura e por uma nova maneira de pensar a estratégia. Então, assim, ler os nossos livros é importante. Também tem um livro chamado Mindset da Inovação, do Guilherme Horn, que é fantástico. Esse já é um bom começo: ler. Depois que todo mundo entrar em um acordo e perceber que é isso que precisam fazer, partir para a parte de operacionalizar as coisas. É importante ler, discutir e implementar. 

Saber Cooperar: O que podemos esperar do futuro?

Salibi Neto: Pode ser muito brilhante para uns e um tormento para os que não se adaptarem. É brilhante, porque a gente vive hoje em um mundo de tecnologias cada vez mais baratas que fazem com que a gente tenha uma vida prática; que a ciência aumente a nossa longevidade; que as máquinas pensem como nós (e logo pensarão melhor que nós). A gente vive em um mundo novo e dirigido pela tecnologia, e quem não souber se adaptar vai ser engolido. Não tem jeito, não tem meio- termo. Já não é uma opção, é uma obrigação.

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Esta matéria foi escrita por  Tchérena Guimarães e está publicada na Edição 35 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação

Sonhos reciclados durante a pandemia

O cenário era desanimador. Em março de 2020, pouco se sabia sobre as principais formas de transmissão do novo coronavírus. Naquele primeiro momento, acreditava-se que tocar superfícies supostamente contaminadas seria o suficiente para infectar qualquer pessoa com a doença. As cooperativas de reciclagem tinham de se preocupar tanto com a saúde dos cooperados quanto com a continuidade dos negócios. Afinal, por todo o país, diversos municípios publicaram decretos proibindo a coleta seletiva, fechando os galpões das cooperativas ou até mesmo obrigando os resíduos recicláveis a passar por uma espécie de “quarentena” até que os supostos vírus que poderiam estar neles morressem. Com isso, milhares de catadores se viram ameaçados de ficar sem fonte de renda por todo o país.

Mais de um ano depois, o panorama é completamente diferente. As cooperativas retomaram suas atividades, afastaram apenas os cooperados que eram considerados de risco, adotaram novas práticas sanitárias e de distanciamento social e, com mudanças no mercado, agora faturam o mesmo, ou – em alguns casos – até um pouco mais do que antes da pandemia.

Os resultados têm sido surpreendentes. Até o momento, as principais cooperativas registraram poucos casos de contaminação entre os cooperados e nenhuma hospitalização ou morte por Covid-19.

“Eu podia falar que foi ruim, é a história que todo mundo conta; só que pra gente teve momentos ruins, mas também teve momentos bons. Quando a pandemia começou, e ninguém sabia como ia ser, o governador do Distrito Federal editou uma portaria proibindo a coleta seletiva na capital e no entorno. Ficou complicado, porque temos 11 contratos de coleta seletiva e atuamos em 15 cidades do DF. Em quase metade dos municípios e no entorno de Brasília, a coleta é feita por cooperativas”, explica Cleusimar de Andrade, da Cooperativa Recicle a Vida, coordenador da recém-criada Câmara Temática das Cooperativas de Reciclagem da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB).

Segundo ele, a categoria conseguiu, junto ao governo distrital, se equiparar aos garis como prestadores de serviços essenciais e, dessa forma, teve acesso aos auxílios financeiros concedidos para os trabalhadores que precisaram ficar em casa. Cerca de três meses depois da restrição, os cooperados puderam voltar às atividades.

“Quando começamos a ver que o vírus não se espalhava pelos materiais, começamos a nos organizar para voltar. Nas cooperativas, onde trabalhamos em esteiras, passamos a fazer distanciamento, a trabalhar usando máscara, EPI, luvas. Com mais segurança, foi possível trazer mais gente”, relembra.

CRESCIMENTO

Mas, como ficou a renda dos cooperados? De acordo com a pesquisa Ciclosoft 2020, em 545 cooperativas, no ano de 2019, a maioria dos catadores tinha renda entre um e dois salários mínimos (42,99%); na pesquisa de 2020, , realizada de julho a outubro, 58,72% dos cooperados relataram uma queda na renda, 20% permaneceram na mesma faixa e, por incrível que pareça, quase um a cada oito (12,48%) passou a ganhar mais. 

Para Cleusimar, esse aumento deve-se ao fato de que o perfil de consumo dos brasileiros – especialmente nas grandes cidades – mudou ao longo da pandemia. Com mais gente ficando em casa, mesmo que o isolamento não tenha sido observado em todo o território nacional, mais e mais pessoas começaram a comprar produtos pela internet, tanto por delivery de alimentos como outros produtos, como eletrodomésticos, roupas e móveis.

“Isso ajudou a melhorar a situação, porque as pessoas começaram a gerar mais resíduos, ter mais embalagem e, ao mesmo tempo, veio a questão do mercado internacional, que diminuiu a importação de matéria-prima, e o material reciclado aumentou de preço. Alguns produtos quase dobraram de preço, como o papelão. O ferro, que era vendido a cerca de R$ 300 a tonelada, foi pra mais de R$ 1.100. Foi uma oportunidade pra melhorar a renda”, reconhece.

Apesar dessa boa notícia,  o crescimento do setor de reciclagem não foi igual em todas as áreas. Nas cooperativas com pessoas mais velhas ou com comorbidades, o trabalho praticamente foi paralisado; também foi preciso criar campanhas de ajuda para os cooperados afastados por questões médicas, como conta Aline Souza da Silva, presidente da Rede de Cooperativas de Catadores de Materiais Recicláveis do DF (Centcoop).

“A gente trabalha para não precisar dessas coisas, para ter dignidade. Mas, para esses que ainda não podem voltar, fazemos campanhas, adquirimos cestas básicas, cestas de produtos de limpeza”, conta ela. As cooperativas vinculadas à Centcoop também têm recebido auxílios na forma de doações de máscaras, EPIs, álcool em gel e outros insumos para que possam desenvolver suas atividades com segurança.

LONGE DA CAPITAL

Em São Paulo, cidade que conta com duas importantes centrais mecanizadas de triagem, as cooperativas associadas que têm contratos com a prefeitura conseguiram manter mais de 1.000 catadores afastados, com um auxílio que chegava a R$ 1.200 por mês, durante quase todo o ano de 2020. Quem explica é o presidente da Cooperativa de Coleta Seletiva da Capela do Socorro (Coopercaps), Telines Basílio do Nascimento Jr, o Carioca.

“Essas duas centrais mecanizadas absorveram todo o resíduo reciclável da cidade. Foi com as vendas delas que a gente conseguiu manter os cooperados em casa dando o auxílio. Por elas serem mecanizadas, precisam de um contingente menor trabalhando”, detalha.

A vida das cooperativas que não contam com esse tipo de convênio, no entanto, foi um pouco mais difícil. 

“As cooperativas que não têm nenhum relacionamento com a prefeitura ficaram numa situação delicada; algumas conseguiram o auxílio do governo federal, outras não. Para essas, a gente precisou fazer uma vaquinha para auxiliar”, diz o dirigente.

Para os próximos meses, os líderes das cooperativas de reciclagem paulista esperam que o preço dos materiais fique mais próximo dos patamares antigos. Com isso, esperam se proteger de eventuais perdas nas rendas dos cooperados.

“Agora o preço está começando a voltar ao normal e estamos nos preparando para voltar a crescer. A gente faz a comercialização de maneira centralizada para conseguir um preço melhor. Nosso objetivo é atender à indústria e chegar neles antes que o mercado volte à normalidade”, explica Aline. Para ela, a proteção de uma negociação conjunta por meio da Câmara Temática de Reciclagem da OCB pode ser fundamental para isso.

EM DEFESA DOS COOPERADOS

A criação da Câmara Temática das Cooperativas de Reciclagem dentro do âmbito da OCB, em março deste ano, pode se tornar um ponto de virada para o setor em um futuro próximo. A possibilidade de ter um fórum específico para definir pautas estratégicas e  poder negociar de maneira coletiva com fornecedores, clientes e o poder público representa um avanço na agenda dessas instituições.

Atualmente, a OCB representa um total de 97 cooperativas de reciclagem em todo o Brasil, com cerca de 3 mil cooperados em 11 estados brasileiros e no Distrito Federal. Todo o processo de implantação da Câmara foi feito remotamente, segundo Alex Macedo, analista técnico e econômico da organização.

“Até então, a gente não tinha um espaço institucional formalizado pra poder ouvir os representantes, saber necessidades, anseios, questões que envolvem o poder público, problemas de gestão e confiança. A gente começou tudo de forma on-line; no ano passado ainda não tinha a possibilidade de fazer presencial, toda a articulação e as reuniões foram feitas de forma remota”, relata.

Os objetivos da Câmara, segundo ele, são buscar uma aproximação com o Ministério do Meio Ambiente, com o setor de embalagens, para tratar a questão da logística reversa, e também com o Congresso Nacional, para abordar questões e monitorar leis e projetos para o setor, além de garantir a segurança jurídica e ver oportunidades para os cooperados.

“Nós temos sentido essa aproximação. As pessoas viam a gente como miseráveis, coitadinhos, queriam fazer doação. Agora, que começamos a nos organizar realmente como empresas, começaram a nos enxergar de outra forma. Essa câmara nos coloca essa forma de nos organizar e não sermos excluídos”, explica o coordenador da Câmara Temática.

Para Aline Souza, da Centcoop, a negociação coletiva tende a fortalecer todo o setor, inclusive no momento de conseguir preços melhores para os materiais que são reciclados pelas cooperativas e revendidos para o setor industrial.

“Antes da pandemia e de a rede ser inaugurada, o pessoal vendia o papelão a R$ 0,35, o quilo; agora, subiu para R$ 1,50. A gente sabe que na indústria não custa menos de R$ 3. Esperamos que a Câmara Temática da OCB nos ajude a fortalecer o nosso trabalho e a coleta seletiva. E uma parte importante disso é a gente trabalhar pro produto não ser tributado novamente, senão fica inviável”, alerta.

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Esta matéria foi escrita por Fábio Fleury e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação

Mão dupla

O paranaense Aucenir Ribeiro de Assis largou o campo para virar motorista autônomo há 10 anos. Morador de Jesuíta, município no interior do Paraná, precisou viajar por todo o Brasil levando diferentes tipos de carga. Na última década, precisou fazer diversas manutenções caríssimas no veículo. Mas, no ano passado, a situação apertou: depois de milhares de quilômetros rodados país afora, estava na hora de aposentar seu companheiro de estrada e adquirir um caminhão novo. Foi graças à intercooperação entre a cooperativa em que é associado — a Cooperativa de Transporte de Cafelândia (Coopercaf) — e o Sicredi Nossa Terra que essa troca foi possível.  

De acordo com a Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado do Paraná (Fetranspar), mais de 18 mil caminhoneiros passam pelas estradas do estado durante o ano. Tal qual seu Aucenir, muitos deles precisam trocar peças, o caminhão e/ou a carreta por uma versão mais atual para continuar trabalhando. A burocracia e as altas taxas de juros de muitos bancos poderiam tornar o crédito inviável para um motorista autônomo. Mas, graças à intercooperação entre cooperativas de transporte e de crédito, esse empréstimo é possível – e acessível. 

“A intercooperação facilita muito o acesso e as oportunidades para o associado”, diz Aucenir. As duas principais vantagens desse tipo de parceria para o cooperado são a facilidade para negociar o crédito e os juros mais baixos. “Uma pessoa como eu, de baixa renda, não conseguiria se enquadrar para conseguir o crédito que precisava em um banco tradicional. Graças à minha cooperativa e ao Sicredi, consegui o empréstimo que precisava, a juros acessíveis. É uma grande parceria e uma grande oportunidade para todos nós”, relata.  

APOIO MÚTUO

A Coopercaf congrega, hoje, centenas de motoristas como Aucenir. Ela tem a intercooperação como um de seus princípios para o crescimento, tanto da cooperativa como para os cooperados. Prova disso é que presta serviços de transporte, principalmente, para cooperativas, como a Copacol, localizada na região sudoeste do Paraná.

Aliás, foi dentro da Copacol que a Coopercaf foi fundada, há cerca de 25 anos. Hoje, a cooperativa de agronegócio é responsável por mais de 80% do serviço de transporte fretado, segundo o presidente da empresa, Edson Zonta. Ele relata que, de 1998 pra cá, sempre houve essa parceria entre as duas cooperativas. “A intercooperação estimula um maior faturamento dos associados e a Copacol não precisa correr atrás de ninguém para fazer o transporte dos produtos”. 

Segundo o contador da Coopercaf, Marcelio Koehler, antigamente, os motoristas autônomos sofriam para arranjar trabalho na região durante a entressafra. A situação mudou com a chegada da Coopercaf e das demais cooperativas de transportes. 

“Nossa região é totalmente agrícola. Se o motorista era daqui, precisava buscar trabalho em outros estados para conseguir manter a renda quando terminava a safra daquele ano”, diz Koehler. “Antes, a demanda era de um ou dois meses no ano. O benefício de se associar a uma cooperativa é que tem trabalho o ano todo.” 

A parceria entre as duas cooperativas tem gerado inúmeros frutos, inclusive para a Copacol. Fundada em 1963 no interior do Paraná, a cooperativa reúne os principais produtores de frango e peixe do estado. Atualmente, conta com 6 mil cooperados e exporta os produtos para todo o Brasil e mais de 50 países. 

De acordo com o superintendente de logística da Copacol, Itamar Ferrari, esse número só foi alcançado graças à cooperação entre cooperativas. “A intercooperação nada mais é do que ser atendido por uma cooperativa de uma área ou de um ramo que não é o meu. Serve para que elas, cada uma no seu segmento, se fortaleça ainda mais”, diz, destacando a parceria de décadas com a Coopercaf. “Antigamente, eram motoristas individuais que trabalhavam conosco. O que viram lá atrás foi a necessidade de criar uma cooperativa de transporte, para atender a Copacol e os próprios cooperados.” 

ALIANÇA NO SUL

A intercooperação da Copacol se estende a outras cooperativas do Paraná. Além da Coopercaf, tem forte parceria com a Cotriguaçu, focada em contêineres; com a Frimesa, maior central de cooperativas de abate e processamento de suínos do Paraná e uma das maiores empresas do Brasil de recebimento de leite; e com a Coagru, da agropecuária. 

Ferrari destaca, ainda, a intercooperação feita com as cooperativas de crédito. “A Sicredi Nossa Terra, de Cafelândia, iniciou suas atividades como um braço financeiro dentro da Copacol”, diz o superintendente, salientando que a maioria dos associados da Copacol também são associados de alguma instituição de crédito, como Sicoob, Cresol e Sicredi. 

O Sicredi, por sua vez, possui cooperativas entre as 10 maiores de crédito do Brasil, como Sicredi Central PR/SP/RJ, Sicredi Vanguarda PR/SP/RJ e Sicredi União PR/SP.  O Sicredi Nossa Terra PR/SP, braço sudoeste paranaense da cooperativa, surgiu em 1988 com o nome de Cooperativa de Crédito Rural (Credicopa), formado por 47 agricultores da Copacol. Em 1999, se desvinculou da cooperativa-mãe e, em 2008, passou a se chamar Sicredi Nossa Terra. Hoje, além da região de Cafelândia, atende cooperados de outros 13 municípios do Paraná e de São Paulo, tanto da agropecuária como do transporte. 

Maura Carrara, presidente do Sicredi Nossa Terra, destaca a importância da intercooperação com cooperativas do interior do Paraná, com destaque para as cooperativas de consumo, canavieiro e de transporte, para um efeito dominó na expansão das demais cooperativas locais.

“A intercooperação sistêmica assegurou especialmente o fortalecimento, o ganho de escala e a segurança que o setor exige. E, na soma de tudo isso, quem ganha são os associados e as comunidades com cooperativas pujantes”, afirma. 

ROTA DE CRESCIMENTO

Já em Curitiba, um trabalho de intercooperação entre cooperativas de transporte e de crédito tem rendido frutos importantes para os trabalhadores autônomos. A Transpocred, cooperativa de crédito de Santa Catarina, chegou ao Paraná em 2018 e, até o ano passado, já se expandiu para municípios do interior, como Cascavel, Londrina e Maringá, com previsão de começar a operar em Foz do Iguaçu ainda este ano. 

Focada em crédito para cooperados do Ramo Transporte, a Transpocred abriu um posto de atendimento junto ao Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas no Estado do Paraná (Setcepar). Além de atender seus associados, tem feito um trabalho conjunto com os motoristas autônomos ligados à Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado do Paraná (Fetranspar). 

Mas o foco está entre as cooperativas de transporte do estado. O gerente da Transpocred em Curitiba, Jacson Melo, destaca o desejo de ampliar ainda mais o alcance entre os associados paranaenses. Hoje, atua fortemente com três cooperativas de cargas e transporte rodoviário no Paraná: Cooperleste, em Piên; Cooplog, em Maringá; e a CTA, em Astorga. “Mas o desejo é expandir cada vez mais no estado, e queremos nos aproximar das outras 32 cooperativas de transporte”, diz Jacson.

Atualmente, a cooperativa conta com 2.258 cooperados (pessoas física e jurídica) em todo o Paraná. Desde 2018, já liberou mais de R$ 67 milhões em operações de crédito no estado, relacionados a empréstimos e financiamentos. Segundo Jacson, cooperativas de crédito como a Transpocred “são importantes porque são segmentadas, ou seja, nascemos dentro da área de transporte e sabemos como o negócio funciona. Temos conhecimento dos produtos e serviços que casam com eles, como os tipos e preços de caminhões novos e usados, como funciona o capital de giro, assim por diante. Por isso conseguimos oferecer créditos a valores mais baixos para os motoristas”. 

EM ALTA

Apesar da pandemia de Covid-19, o ano de 2020 trouxe alguns resultados benéficos para as cooperativas paranaenses. De acordo com levantamento feito pela área de monitoramento do Sistema Ocepar, no Paraná, as 59 cooperativas agropecuárias do estado tiveram um crescimento de 36,7% no ano passado, com valor que superou R$ 100 bilhões — número alcançado graças à intercooperação.

A intercooperação é considerada o sexto princípio fundamental do cooperativismo, segundo o congresso coordenado pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI). De acordo com o superintendente do Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar), Robson Mafioletti, a intercooperação é fundamental para o ganho em escala. “Quanto mais cooperativas estiverem juntas, maior é a quantidade produzida, e até mesmo a aquisição de insumos e matérias-primas. Isso reflete na qualidade e no valor dos produtos e serviços ofertados pelos cooperados”, diz ele. 

Mafioletti destaca o trabalho feito pela Transpocred, de Santa Catarina, e a parceria com a Fetranspar e Setcepar; e a Evolua, cooperativa de crédito de Francisco Beltrão, no sudoeste paranaense, trazendo inúmeros benefícios para seus associados.  “[A intercooperação] foi importante para trazer crédito. Afinal, esse é o insumo de qualquer negócio e qualquer empreendimento”, afirma. 

O superintendente ainda ressalta a intercooperação entre outras cooperativas agropecuárias do estado, como Castrolanda, Frísia e Capal — responsáveis por leite, carne suína e trigo, respectivamente —, e que formaram a Unium. Com menos de quatro anos de existência, o faturamento em conjunto das três cooperativas cresceu 21,6% e o número de cooperados aumentou em 45,5%, se comparado com 2014, segundo relatório da própria marca. Outro destaque é a Cotriguaçu, central logística ferroviária formada por Coopavel, Copacol, Lar e C. Vale, que investiu R$ 300 milhões para a construção do novo corredor de exportações no Porto de Paranaguá.  

BRASIL MAIS COOPERATIVO

Na manhã de 25 de junho de 2021, lideranças cooperativas das regiões Sul e Nordeste se reuniram com técnicos de entidades; com o presidente do Sistema OCB, Márcio Lopes de Freitas; o representante do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), Cristian Fischer; e o Secretário de Agricultura Familiar e Cooperativismo no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Fernando Schwanke, para debater o Projeto Eixo Intercooperação do Programa Brasil Mais Cooperativo. 

O projeto é um exemplo de como a intercooperação pode ajudar as cooperativas de diferentes regiões e áreas, inclusive do outro lado do país. Liderado pela OCB e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), foram reunidas 24 cooperativas de sete estados do Nordeste com nove cooperativas dos três estados do Sul. Segundo o superintendente da Ocepar, Robson Mafioletti, as reuniões já estão avançadas e esperam que os trabalhos de intercooperação do projeto comecem em breve. “Temos várias possibilidades de parcerias. São cooperativas agropecuárias e que poderão comercializar os produtos do Paraná para a Região Nordeste, incluindo hortifrúti, queijos, carnes e mel”, diz. 

De acordo com o presidente do Sistema OCB, essa é uma iniciativa importante de incentivo à intercooperação. “Não será fácil, mas valerá a pena quando cumprirmos com esse processo de integração. Uniremos esforços para que as cooperativas possam trocar informações e se desenvolver de forma conjunta. Precisamos de resiliência, e o apoio do governo é fundamental como alavanca, além da parceria com o IICA, que poderá abrir portas para outras integrações. Agradeço a cada uma das cooperativas que aceitaram o convite desta parceria”, frisou o dirigente.

Apesar de o programa não contar com cooperativas de crédito da Região Sul, quem trabalha no setor vê a iniciativa com otimismo. Jacson Melo, gerente da Transpocred, afirma que tanto as cooperativas de transporte como as de crédito serão beneficiadas indiretamente. 

“O Brasil Mais Cooperativo é focado nas cooperativas agrícolas. Mas, a partir do momento em que aumentarem o rendimento graças ao incentivo de programas como esses, os motoristas terão mais trabalhos, terão uma demanda ainda maior por novas peças e veículos, e, consequentemente, aumentará a busca por crédito”, completa. 

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Esta matéria foi escrita por Renato Crozatti e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação

Conectados pelo cooperativismo

O cooperativismo está em vias de se tornar uma importante ferramenta de inclusão digital no campo. O Projeto de Lei 8.824/2017, que autoriza as cooperativas a operarem os serviços de telefonia móvel e banda larga, foi aprovado na Câmara dos Deputados e segue para tramitação no Senado. De autoria do deputado Evair de Melo (ES), presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop), o projeto pretende ampliar a oferta do serviço de telecomunicações a um preço mais baixo, e com ênfase nas comunidades rurais. 

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 11,6 milhões de domicílios no país têm condições de arcar com os custos de uma conexão com a internet, mas não dispõem do serviço em suas localidades. Em outro levantamento, de agosto de 2020, o mesmo instituto constata que 6 milhões de estudantes brasileiros — da pré-escola à pós-graduação — não dispõem de acesso domiciliar à internet para acompanhar aulas e outras atividades on-line. E o último censo agropecuário, realizado há quatro anos, identificou mais de 3,6 milhões de propriedades sem internet, o que corresponde a mais de 70% das unidades no campo.

A legislação em vigor atualmente em relação ao setor engessa o processo, ao obrigar as cooperativas a criarem empresas comerciais para a prestação do serviço de telecomunicações — o que impacta negativamente no fortalecimento do nosso modelo de negócios, além de aumentar os custos da prestação dos serviços.     

Tânia Zanella, superintendente da OCB.

Reconhecer o cooperativismo como uma alternativa viável para a prestação de serviços de internet colabora com a universalização do acesso das telecomunicações em todo o território brasileiro e contribui para o desenvolvimento econômico e social”, destaca Tânia Zanella, superintendente da OCB.

Para ela, o êxito das cooperativas de infraestrutura na oferta de energia elétrica no interior do país confere ao cooperativismo a competência necessária para também levar a conectividade ao campo. Vale destacar: atualmente, mais de 4 milhões de pessoas têm acesso a serviços de qualidade e à universalização da energia elétrica por causa de uma coop. 

PRIORIDADE

A aprovação do PL 8.824/2017 — que autoriza as cooperativas a fornecerem serviços de telecomunicações no campo — é uma das sete prioridades da Agenda Institucional do Cooperativismo para 2021. Por isso, toda a equipe técnica e de representação da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) está empenhada em agilizar a aprovação do projeto no Senado.

“Atualmente, 35 mil famílias de produtores rurais têm acesso à internet graças às empresas de propriedade de cooperativas. Esse acesso tem ajudado a ampliar a eficiência da administração das propriedades rural, colaborado com a formação e a qualificação de pessoal por meio de aulas on-line, e estimulado a incorporação de novas tecnologias e uma produção cada vez mais sustentável. Por esse motivo, é tão importante garantirmos que as cooperativas possam ser permissionárias diretas deste tipo de serviço”, explica Tânia Zanella.

O presidente da Confederação Nacional das Cooperativas de Infraestrutura (Infracoop), Jânio Stefanello, acrescenta: o cooperativismo tem tudo para ser um grande braço de desenvolvimento na condução dessa infraestrutura e da tecnologia para o interior. “É por isso que estamos todos engajados nessa causa”, reforça.

Stefanello espera transformar o quanto antes os 20 mil consumidores das atuais empresas de telecomunicação ligadas à Infracoop em cooperados. Com  a mudança, explica o dirigente, o consumidor passará a participar ativamente da gestão da cooperativa, na definição da qualidade do serviço e do preço. 

PIONEIRISMO

A cooperativa de geração e distribuição de energia elétrica gaúcha Coprel foi uma das pioneiras na criação de empresa limitada para a prestação do serviço de telecomunicações. Atualmente, a Coprel Telecom oferece cerca de 32 mil conexões urbanas e rurais, em 35 municípios do Rio Grande do Sul. Ela vem cumprindo com sucesso o papel de levar a internet para o campo, mas, no que depender dos dirigentes da Coprel, será transformada em cooperativa assim que o PL 8.824/2017 for aprovado e transformado em lei.

Jânio Coprel

“Para os consumidores, é melhor ter um serviço prestado por cooperativa. A conexão será mais fácil e a um custo menor”, explica Luís Fernando Volpato, facilitador da Coprel. 

Ele menciona, ainda, que a área rural não é atrativa para as grandes operadoras. Por isso, as cooperativas de infraestrutura são os principais aliados do governo no processo de universalização da internet no campo. Atualmente, do total de propriedades rurais conectadas à rede mundial dos computadores (cerca de 20%), apenas uma pequena porcentagem (entre 6% e 8%) consegue utilizar o acesso em seus sistemas de produção, plantio e colheita. 

A conexão é importante para o agricultor e, especialmente, para seus filhos e netos, na formação e capacitação, sem afastá-los do meio em que vivem”, ressalta o senador Luís Carlos Heinze (RS), vice-presidente da Frencoop, também empenhado em agilizar a tramitação do PL 8.824/2017 no Senado e na busca de recursos federais para financiar os projetos de conectividade rural das cooperativas. 

Para ele, a expansão da conectividade rural por meio das cooperativas é o melhor caminho para a melhora da eficiência do processo produtivo e da permanência do homem no campo. 

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POTENCIAL PARA CRESCER

Das 4.868 cooperativas com registro ativo na OCB, 246 são do Ramo de Infraestrutura. 

Juntas, elas beneficiam diretamente 1,4 milhões de cooperados e geram 7.366 empregos.

91 dessas cooperativas (37%) atuam na distribuição de energia com potencial para oferecer serviços de acesso à internet nas regiões onde atuam.

Fonte: Anuário Brasileiro do Cooperativismo 2021, com dados referentes a dezembro de 2020.

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Esta matéria foi escrita por Rosana de Cássia e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Onde tudo começou

A Inglaterra tem 177 anos de tradição no cooperativismo. Foi lá — mais especificamente, em Rochdale —, que surgiu a primeira cooperativa do mundo. Apesar disso, nosso modelo de negócios ainda não é amplamente conhecido na terra da rainha Elizabeth, nem nas outras três nações que compõem o Reino Unido: País de Gales; Escócia, e Irlanda do Norte.

O cooperativismo tem se transformado em uma terceira via econômica ao longo da história, sendo uma alternativa justa e socialmente responsável ao capitalismo e ao socialismo. Acontece que ele ainda não é amplamente divulgado para a sociedade. Para  ganhar mais espaço aqui na Grã- Bretanha, seria importante dar mais publicidade ao movimento”, afirma Rose Marley, presidente da Co-operatives — entidade de representação equivalente ao Sistema OCB no Reino Unido. 

Como é possível perceber, o desejo de tornar o cooperativismo amplamente conhecido por sua capacidade de gerar trabalho, renda e felicidade para as pessoas não é um desejo apenas das cooperativas brasileiras, mas de suas irmãs britânicas. Afinal, em momentos de crise como o que estamos vivendo — por conta da pandemia da Covid-19 — as pessoas ficam mais abertas  a mudanças e passam a apostar em modelos de negócios capazes de reaquecer a economia. E o cooperativismo sempre fica mais forte em cenários como esse. 

Quer uma prova?  As coops britânicas tiveram quatro vezes menos probabilidade de falir em 2020 do que outras empresas, de acordo com o anuário The Co-op Economy 2021, divulgado pela Co-opertives do Reino Unido em 28 de junho. Além disso, apenas 1,5% das cooperativas foram dissolvidas no ano passado, em comparação com 6,5% das empresas  mercantis.

O relatório revela, ainda, que o número de cooperativas composto por membros de clubes esportivos comunitários, associações de habitação e de crédito, também está crescendo no Reino Unido. Para completar, a receita total do setor aumentou de 38,6 bilhões de libras para 39,7 bilhões de libras —, um acréscimo de 2,8%.

“Historicamente, somos um modelo de negócios conservador em relação aos riscos do mercado financeiro. Quando a pandemia chegou, estávamos com a saúde econômica em dia. Foi esse conservadorismo que nos manteve vivos. Além disso, tivemos a união dos cooperados. A combinação de baixos níveis de dívidas e risco, e a cooperação de todos foi fundamental para passar pela instabilidade econômica causada pela pandemia”, destacou Ben Reid, CEO da Midcounties, maior cooperativa do Reino Unido, especializada na comercialização de produtos e serviços variados, como alimentos, viagens e cuidado com crianças.

DIFERENCIAIS

Além de criarem oportunidades de emprego e renda, as cooperativas britânicas oferecem serviços de qualidade a custo competitivos. Um detalhe muito importante do movimento de cooperativas daquele país é a união, a força dos cooperados. 

Quando os problemas vêm, os cooperados se apoiam. A pandemia reforçou a necessidade de cooperação e deixou à mostra as desigualdades. Foi um momento importante para as pessoas entenderem o movimento cooperativista e para a interação das cooperativas no Reino Unido”, revelou Reid.

A fórmula da resiliência cooperativista está na união dos envolvidos. Segundo Rose Marley, da Co-operatives UK, as coops britânicas conseguiram se manter ativas e em crescimento durante a pandemia. 

“As cooperativas são negócios resilientes e sustentáveis, que ajudam a reduzir as desigualdades sociais. Isto acontece porque tanto os cooperados quanto as cooperativas reinvestem o que ganham na economia local”, explica Rose. 

 Além disso, sempre que ocorre uma crise econômica, as cooperativas têm o cuidado de pensar localmente. “Como as decisões nas cooperativas são tomadas pelos cooperados, que são pessoas da própria comunidade, eles priorizam o bem- estar de todos e pensam sempre nos impactos de longo prazo de suas ações; j. Já investidores comuns, priorizam o lucro e tomam decisões com base em retornos a curto prazo. As cooperativas, pacientemente, acumulam, reinvestem as reservas e usam o capital dos membros sempre que possível, em vez de acumular dívidas para alcançar um crescimento mais rápido”, esclarece.

Justamente por isso, nenhuma organização tem tanta capacidade de se adaptar aos períodos de recessão econômica como as cooperativas. O anuário “The Co-op Economy 2021” — produzido no Reino Unido — revela que as cooperativas têm mais chances de sobreviver nos próximos cinco anos do que outros modelos de negócio, por colocar as pessoas em primeiro lugar.

O coração de cada cooperativa sempre foi a ideia de que, ao nos unirmos, todos podemos melhorar nossa situação e garantir que ninguém seja deixado para trás”, endossa Rose Marley. 

Vale destacar:  o cooperativismo desempenha papel fundamental na trajetória dos países para um desenvolvimento sustentável e equitativo, que vai muito além da geração de empregos. Embora a participação das cooperativas ainda no produto e no número total de empresas seja relativamente pequena na maioria dos países, sua promoção e expansão pode ser um instrumento relevante para o cumprimento dos objetivos econômicos, sociais e ambientais do país.

EQUIDADE DE GÊNERO

Outro diferencial importante do cooperativismo britânico: a forte presença de mulheres na liderança das cooperativas. De acordo com Rose Marley, no Reino Unido, esse é o modelo de negócios que tem mais líderes mulheres, seja no ramo crédito, agropecuário ou de pequenos negócios. “No Reino Unido, nota-se uma presença maciça das mulheres nas lideranças das cooperativas. Isso tem a ver com o propósito e com a motivação das cooperativas”, revelou. 

Para reforçar esse dado, o Reino Unido conta com uma grande líder cooperativista (a primeira mulher presidente da Aliança Cooperativa Internacional): Pauline Green, referência para o recém-criado Comitê Nacional de Mulheres Cooperativistas do Brasil. 

De acordo com o Reid, a trajetória de Pauline é brilhante. “Ela atravessou o ‘teto de vidro’ , porque conseguiu chegar onde nenhuma mulher tinha ido antes. O movimento cooperativista no Reino Unido tem como princípio a justiça em relação à raça e ao gênero. Pauline é a pessoa que concretiza esse princípio e torna-se uma inspiração para as mulheres no mundo. Como ela, chegamos em um lugar muito melhor.”.

ADAPTAÇÃO

Desde o início da pandemia da Covid-19, as cooperativas britânicas tiveram de mudar a forma de realizar negócios. A maioria delas aderiu às novas tecnologias, como as plataformas de comunicação que viabilizam reuniões on-line para manterem-se ativas durante o período de isolamento social, que foi bastante rígido em todo o Reino Unido. 

Ben Reid, da Midcounties, destaca que essas ferramentas se tornaram muito significativas, por viabilizarem reuniões on-line entre os cooperados e entre os colaboradores de uma cooperativa. “Essas tecnologias permitiram que os negócios funcionassem de casa. Essa mudança foi positiva e será mantida, assim como o trabalho remoto, em alguns casos”, defendeu Reid, que também é membro do Conselho da Aliança Cooperativa Internacional (ACI).


EM NÚMEROS

Existem no Reino Unido 

7.237 cooperativas que, juntas, melhoram as vidas de

13,9 milhões de cooperados

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Um pouco de história....

O Reino Unido é o berço do cooperativismo no mundo. Foi lá que nasceu essa filosofia transformadora, que mudou a forma como a humanidade busca o desenvolvimento econômico e valoriza as pessoas. O movimento cooperativista foi criado por um grupo de trabalhadores —, em grande parte, tecelões —, durante a Revolução Industrial, como forma de sobreviver ao aumento do desemprego e aos baixos salários pagos pelas indústrias europeias.

Criada em 1844, por 28 operários —– 27 homens e uma mulher —-, no bairro de Rochdale-Manchester, no Reino Unido, a Sociedade dos Probos de Pioneiros Rochdale (Rochdale Quitable Pioneers Society Limited) foi a primeira cooperativa a surgir no mundo. Esse grupo se reuniu várias vezes durante um ano para definir os princípios de um novo sistema econômico, diferente das empresas existentes na época. O sucesso da iniciativa passou a ser exemplo para outros grupos.

O grande feito dessa organização foi ter redigido um estatuto social que estabelecia objetivos mais amplos para o empreendimento e definia normas igualitárias e democráticas para a constituição, manutenção e expansão de uma cooperativa de trabalhadores. Essas normas, depois de serem debatidas em congressos internacionais, foram adotadas universalmente como princípios cooperativistas. 

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Esta matéria foi escrita por Gabriela do Vale e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Como nasce um líder

Abre Campo é uma cidade como centenas de outras, típicas do interior de Minas Gerais. Uma igreja no centro, as ruas comerciais onde vendedores e clientes se conhecem pelo nome, árvores bem- cuidadas que refrescam os dias mais quentes. Tem cerca de 13 mil habitantes e suas principais atividades econômicas estão ligadas ao campo —– milho, café e criação de gado, principalmente de leite. Fica às margens da BR-262, a cerca de 220 quilômetros de Belo Horizonte.  

No fim da década de 1990, uma comissão de comerciantes e empresários de Abre Campo pegou a estrada até a capital mineira com um pedido a fazer: evitar que o Banco Credireal, fundado na década de 1920, fechasse a única agência bancária existente na cidade. 

Com a demanda debaixo do braço, bateram na porta da sala de Marco Aurélio Almada, que trabalhava, em uma sala fechada do banco, com os estudos que embasariam o encerramento de mais de 100 agências espalhadas pelo estado. O banco vivia uma reformulação à época, e seria incorporado pelo Bradesco pouco depois.  

Almada ouviu dos comerciantes que, sem a agência, os aposentados teriam de pegar estrada até cidades vizinhas para sacar suas aposentadorias, os comerciantes não conseguiriam mais descontar os cheques dos clientes e os demais moradores teriam de viajar para pagar contas. Um transtorno completo para quem estava acostumado a resolver os problemas financeiros do dia a dia ali mesmo, na praça central de Abre Campo.   

“Eu me senti um banqueiro mau”, confidenciou Almada mais de três décadas depois. Aquele episódio foi uma espécie de turning point na sua carreira. Ao perceber como as decisões tomadas em salas fechadas impactavam na vida de pessoas reais, com suas próprias rotinas e seus hábitos, o então diretor do Banco Credireal ficou pensativo. Ali surgiu nele a semente do cooperativismo.

DISLEXIA

Marco Aurélio Almada nasceu em Belo Horizonte, em 1966. Filho de um alto executivo da mineradora Vale, se acostumou desde cedo com a rotina de um pai atarefado com as rotinas de trabalho e que tinha o costume de viajar a trabalho. 

Logo na infância, recebeu um diagnóstico médico que mudou sua vida. Se, hoje, ele é classificado por colegas de trabalho como uma pessoa “dedicada” e “compromissada”, isso se deve muito ao fato de ter sido diagnosticado com dislexia no começo da vida. 

Naquele momento, a ciência e, a medicina diziam que ele estava condenado, que não tinha futuro, que não iria longe”, conta o superintendente de Gestão e Estratégia, Cláudio Halley, que trabalha diretamente com Almada há cerca de 12 anos. 

“A mãe dele não aceitou esse diagnóstico e o colocou para estudar bastante. E ele foi se conscientizando. A dislexia, portanto, foi uma alavanca de desenvolvimento, um estímulo para a superação de limites”, conta Halley. 

O diagnóstico veio acompanhado de um remédio, amargo nas primeiras doses, mas que se tornou uma companhia para sempre: a leitura. Todas as pessoas que contribuíram para a construção desse perfil, conhecidos de longa data de Almada, o definem como um leitor voraz. 

Quem tem dislexia tem uma dificuldade maior para ler e escrever. Meu hábito de leitura começou nessa época. Eu não gostava, mas me forçava a ler —, de certa forma, até obrigado. Eu lia e custava a entender. Aí, lia uma segunda e uma terceira vez. Depois, passei a ter gosto para isso”, revela Almada.

Se, por um lado, tentou neutralizar as dificuldades de ler e escrever por meio da leitura, por outro, Almada desenvolveu mais uma habilidade crucial para que pudesse chegar ao posto que ocupa hoje: a oratória. Tanto, que é  pela voz que o presidente do Bancoob — formado em Administração de Empresas — conquista seus funcionários. 

CONVITE

Depois do processo que resultou na compra do Banco Credireal pelo Bradesco, Almada foi convidado pelo então presidente do Bancoob, Raimundo Mariano do Vale, para se tornar superintendente da instituição financeira. A situação envolvendo a comissão de comerciantes de Abre Campo ainda estava na sua cabeça quando o executivo explicou para ele o que era o cooperativismo e como a instituição poderia melhorar a vida das pessoas. 

Marco Aurélio Almada ouviu atento a conversa de um de seus “mentores”;, rejeitou o primeiro convite, mas se sentiu impelido a aceitar um novo pedido. 

Eu faria exatamente o mesmo trabalho que eu estava acostumado a fazer, mas veria um resultado prático. Em vez de trabalhar para o lucro dos acionistas do mercado financeiro —, e não vejo mal nenhum nisso —, trabalharia para fazer a diferença na vida das pessoas”, afirmou. 

O processo de convencimento feito pelo primeiro presidente do Bancoob também se tornou a estratégia de Almada para montar a sua equipe. 

Tatiana Carvalho Lima de Alencar Matos, que hoje atua como Superintendente de Educação Corporativa, entrou no Sistema Sicoob em 2004, depois de ter sido entrevistada pelo próprio Almada. Segundo ela, sua entrevista foi incomum. Embora fosse ela quem estava passando pelo processo seletivo, foi o futuro chefe quem falou mais na ocasião. 

“Eu mal sabia o que me esperava naquela entrevista. Em uma conversa de 30 minutos, eu pouco falei, e, ele, ficou contando os desafios do cooperativismo. Ele falava com uma empolgação tão absurda, que eu disse que não queria saber o que eu iria fazer lá, somente que eu queria estar lá”, relembrou.  “Ele passa essa energia na fala, no não -verbal, no olhar, e vai inspirando e carregando o pessoal atrás dele, como um legado”, conta.

A estratégia também marcou a contratação de Michelle Mattos, que entrou na Confederação Nacional de Cooperativas de Crédito do Sicoob como Analista de Normas e, hoje, é gerente de Governança Corporativa do Sicoob.

Fui entrevistada por ele e, logo no começo, ele já se demonstrou brilhante. Eu estava começando a minha carreira e, com toda a empolgação, ele acabou me dando uma aula sobre cooperativismo, responsabilidade social e a importância da instituição para a sociedade. Eu me encantei”,  conta.   

Almada diz que sempre gostou de trazer pessoas “acima da média” e de participar dos processos de seleção de seus funcionários. 

Um episódio, contado com bom humor pelo diretor da subsidiária Seguro de Vida do Sicoob, Marcelo Carneiro Costa, explica. Ele conheceu Almada em 1998, quando comandava uma franquia de pizzas em um shopping de Brasília, e foi convidado a participar de um processo seletivo para o cargo de Assistente I, cujo salário era de R$ 1.500 mensais. Empreendedor, seria seu primeiro emprego de carteira assinada. E, apesar de ser mais qualificado que seus concorrentes durante a seleção, quase não foi aprovado. 

“Fiquei sabendo anos depois, por outras pessoas, que eles iam me dar bomba. Eles achavam que eu era mais qualificado do que a proposta oferecia. Uma das frases que o Almada disse aos colegas na ocasião foi: ‘prefiro segurar um cavalo de corrida do que explorar um pangaré”, conta, em meio a risadas. 

Foi dessa forma, “comparado a um equüino”, como ele mesmo diz, que Marcelo começou sua trajetória no cooperativismo, lançado por Almada.  

CRESCIMENTO

Ao longo das últimas (quase) três décadas, o Sicoob se tornou um sistema, como gostam de frisar os colaboradores. Muitos deles creditam ao próprio Almada a expansão do grupo e do próprio cooperativismo no país. Os termos estrategista, conhecedor e visionário foram citados em todos os depoimentos dados para a construção desse perfil. Talvez por isso, Almada tenha sido eleito em 2020, por voto popular, um “influenciador coop” — título do qual ele muito se orgulha.

Muito por conta de Almada, nós saímos de uma situação de um banco de pouca abrangência, em termos de produtos e serviços, para um banco completo, com uma empresa de seguros, de consórcio, de meios de pagamento, previdência privada, DTVM e operações que qualquer grande banco tenha hoje. Não tem uma linha de negócio que esteja faltando”, explica Rubens Rodrigues Filho, diretor de Controle e Riscos do Centro Cooperativo Sicoob (CCS). 

Reconhecido por seus pares, Almada foi nomeado diretor-presidente do Centro Cooperativo Sicoob em 2020. E, em vez de olhar para o passado, ele prefere se concentrar no futuro. 

“Estamos vivendo um momento de disrupção da indústria financeira como um todo. O cooperativismo de crédito continua supernatual na sua essência, mas faz parte de um negócio que está se tornando obsolescente rapidamente, e que tem que ser rejuvenescido. Esse é o desafio.”

Na contramão das demais instituições financeiras, o Sicoob tem apostado na expansão das agências físicas no país. Hoje, de acordo com o Banco Central, o Sicoob possui 3.523 unidades espalhadas por todo o país, sendo o segundo maior — à frente dos gigantes Caixa Econômica Federal, Bradesco e Itaú. Mas, a mais especial, para Almada, talvez, seja a que está localizada na Rua Doutor Olinto de Abreu, 175, em Abre Campo.


Esta matéria foi escrita por Lucas Pavanelli e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Open Banking: ameaça ou oportunidade?

Grandes transformações tecnológicas envolvendo o sistema financeiro aconteceram no último ano. Primeiro, foi a chegada do Pix, que deu a todos nós a possibilidade de transferir dinheiro a qualquer hora e momento, na maioria das vezes sem precisar pagar tarifa alguma por isso. O próximo passo a ser dado é a implementação do open banking — tecnologia que permite ao correntista de uma instituição financeira (seja ele pessoa física ou jurídica) autorizar o compartilhamento de seus dados (pessoais e transacionais) com outras instituições financeiras. Dessa forma, ele poderá receber e aceitar propostas de produtos e serviços de instituições com as quais não tem vínculo. 

Mas, afinal, quais são as vantagens do open banking para o cooperativismo financeiro? Quem nos responde essa pergunta são os dois titulares do cooperativismo no Conselho Deliberativo do Open Banking: Cesar Bochi, diretor executivo de Administração e Finanças do Sicredi, e Márcio Alexandre, superintendente de Tecnologia e Governança do Sicoob

O open banking chegou com o status de transformação digital no sistema financeiro. Na opinião dos senhores, qual será o impacto dele na vida das pessoas e das instituições financeiras? 

Márcio Alexandre O open banking é a iniciativa de maior impacto sobre o Sistema Financeiro Nacional dos últimos anos. Enquanto o Pix revolucionou a indústria de meios de pagamento, o open banking abrange os principais produtos das instituições financeiras. Sem dúvida, o ponto mais positivo é o reposicionamento do cliente como autoridade máxima para decidir sobre quem pode ter acesso às suas informações. 

A abertura dos dados financeiros dos clientes entre as instituições reguladas pelo Banco Central promete colocar em condições de igualdade novos entrantes e incumbentes, de forma que todos tenham as mesmas informações de seus clientes para oferecer produtos a preços mais justos, ou seja, o open banking promete combater a chamada assimetria de informação existente em nosso sistema financeiro. Por isso, os benefícios esperados são enormes, especialmente os ligados à inovação e à criação de ofertas e produtos sob medida; por outro lado, mesmo diante da adoção dos mais rigorosos padrões internacionais de segurança, a preocupação com abusos e fraudes continua sendo um grande desafio para essas instituições.

César Bochi: Acreditamos que o open banking trará benefícios aos consumidores a partir de uma maior competitividade e transparência, gerando mais equilíbrio entre as instituições financeiras. Com essa tecnologia — sempre mediante a autorização —, as cooperativas financeiras poderão ter acesso às informações dos consumidores e disponibilizar soluções mais adequadas a capa perfil.

Qual será o impacto dessa nova tecnologia nas cooperativas de crédito brasileiras? 

M.A.: As cooperativas financeiras, que normalmente já praticam preços mais justos e conhecem bem a necessidade de seus cooperados, agora podem ter uma visão mais ampla de sua vida financeira e, dessa forma, promover o aumento do engajamento do cooperado com a sua cooperativa. Por outro lado, os cooperados passam a estar mais suscetíveis ao assédio do mercado e podem ter suas margens ainda mais pressionadas.

C.B.: Acredito que o open banking trará novas oportunidades para que as pessoas conheçam os benefícios que as cooperativas de crédito oferecem, pois irá proporcionar um ambiente com mais informação, transparência e liberdade para escolha. Vai haver mais facilidade para quem ainda não é associado a uma cooperativa de crédito conhecer as vantagens do modelo. Assim, o open banking poderá fortalecer ainda mais o cooperativismo de crédito no Brasil, gerando mais inclusão financeira e contribuindo com o desenvolvimento econômico e social das comunidades.

Quais são os desafios de implementação do open banking dentro do ambiente cooperativista? 

M.A.:  Apenas as instituições classificadas como S1 e S2 <abre hiperlink>  são obrigadas a participar de todas as fases do open banking, ou seja, as cooperativas, de forma geral, são obrigadas a participar apenas da fase 3, que trata da iniciação de pagamento. Ainda assim, para aproveitar todas as oportunidades que o open banking pode trazer para o nosso modelo de negócio, pelo princípio da reciprocidade, elas precisam se adaptar e participar de forma voluntária de todas as outras fases. 

Os esforços necessários para as cooperativas participarem do open banking em sua totalidade são enormes. Somente poderemos aproveitar os benefícios advindos da chegada do open banking se, além de nos prepararmos para compartilhar os dados de nossos cooperados, tivermos fôlego para criar iniciativas para se beneficiar das informações de seus cooperados em outras instituições.

C.B.: Acreditamos que o primeiro grande desafio é, além da tecnologia: criar uma cultura de inovação capaz de abarcar o open banking. É um processo desafiador para todas as instituições financeiras, pois mexe bastante na forma de gestão das informações, mas o esforço terá como recompensa um universo de novas possibilidades.

Quais oportunidades de negócio serão criadas pelo open banking para as cooperativas? 

M.A.: As cooperativas, de forma geral, praticam preços mais justos e podem se aproveitar dos dados de movimentação de seus cooperados em outras instituições para reforçar o seu valor. Elas também poderão oferecer condições personalizadas para que seus cooperados possam substituir os produtos adquiridos em outras instituições para os existentes em sua cooperativa.

C.B.: O open banking tem entre seus objetivos a busca por mais competitividade no Sistema Financeiro Nacional, por meio da eliminação da assimetria de informações entre as instituições. Logo, a partir de um sistema financeiro mais transparente, em que o consumidor possui maior domínio sobre suas informações e fácil acesso à informação sobre produtos e serviços praticados no mercado, espera-se que esse movimento contribua para a redução da concentração bancária no Brasil, pois, entre outros aspectos, vai haver maior visibilidade das condições praticadas pelas instituições.

Mesmo existindo desafios, o open banking trará novas oportunidades para que as pessoas conheçam os benefícios que as cooperativas de crédito oferecem, pois a perspectiva é de um ambiente com mais informação, transparência e liberdade para a escolha. Dessa forma, podemos fortalecer ainda mais o cooperativismo de crédito no Brasil, gerando mais inclusão financeira e contribuindo com o desenvolvimento econômico e social das comunidades.

Atualmente, das 834 instituições registradas no ecossistema open banking, mais de 600 são cooperativas. A que os senhores creditam tamanha adesão das cooperativas ao novo sistema? 

M.A.: A definição da obrigatoriedade de participação das instituições em ao menos uma das fases do open banking foi estabelecida pelo Comunicado 36.480, de 4/12/2020. A participação voluntária das cooperativas relacionadas nesse comunicado se limita às fases I, II e IV. Todas as cooperativas relacionadas no documento são obrigadas a se cadastrar desde o início no diretório do open banking, bem como participam do rateio das despesas da estrutura inicial estabelecida pelo Banco Central.

Ainda que a participação seja obrigatória basicamente para a fase III  — que permitirá que os consumidores tenham acesso a serviços de pagamento fora do ambiente do banco, e não apenas nos canais das instituições financeiras com as quais tenham relacionamento —, o que se observa é uma grande adesão voluntária das cooperativas, visto que o open banking se apresenta muito mais como uma oportunidade do que como uma ameaça para essas instituições.

O fato de uma grande quantidade de cooperativas serem detentoras de contas demonstra o nível de sofisticação e comprometimento em atender aos anseios de sua comunidade e, em sua grande maioria, sem deixar a desejar em relação aos serviços prestados pelas instituições financeiras tradicionais.

C.B.: As cooperativas de crédito brasileiras estão muito engajadas e atuantes no processo de implementação do ambiente de open banking do país. Isso acontece em função da consciência sobre as possibilidades que essa novidade gera, tendo em conta a maior facilidade de conexão entre diferentes soluções, o que vai qualificar ainda mais seus portfólios, ainda com a vantagem de economia em custos de desenvolvimento.

Os senhores acham que o open banking vai tornar mais equânime o mercado entre as instituições financeiras e as cooperativas? Por quê?

M.A.: As cooperativas, por conhecerem bem seus cooperados, conseguem praticar condições mais justas em seus produtos. Com a chegada do open banking, elas passam a ter mais condições de personalizar produtos, praticando valores mais justos para um universo maior de pessoas e, desta forma, ampliando o alcance dos benefícios do cooperativismo financeiro. 

As grandes instituições possuem informações acumuladas de um universo maior de pessoas por mais tempo. Nesse sentido, as cooperativas têm mais a aproveitar dos benefícios do open banking do que essas instituições.

C.B.: De forma geral, o open banking integra a Agenda BC#, que visa, entre outros objetivos, tornar o Sistema Financeiro Nacional mais democrático e inclusivo. Essa realidade também se reflete no Sistema Nacional de Crédito Cooperativo, pois permitirá que se façam mais parcerias e, assim, se amplie a oferta de soluções com custos menores para isso.

O open banking tornará disponível uma enorme gama de informações financeiras de clientes bancários por meio do compartilhamento de informações entre instituições financeiras. Como as cooperativas podem aproveitar esses dados de forma inteligente? 

M.A.: As cooperativas, de posse de seus desafios, passam a contar com um leque maior de informações e podem encontrar diferentes formas de resolvê-los. Um bom exemplo disso é a avaliação de risco de seus cooperados, que passa a poder ser redesenhada considerando novas variáveis, antes inexistentes ou mesmo menos confiáveis. 

C.B.: As cooperativas de crédito já se diferenciam pelo alto nível de conhecimento que têm sobre seus associados, o que permite hoje, por exemplo, um alto grau de acerto na concessão de crédito. Com o open banking, esse conhecimento sobre os próprios associados será ampliado a partir do acesso, sempre mediante autorização, dos dados de eventuais relacionamentos com outras instituições financeiras, o que permitirá aprimorar ainda mais o atendimento e a oferta.

Há algum tempo o mercado vem mostrando a importância do trabalho orientado por dados e, a partir disso, de profissionais que tenham essa aptidão, e o open banking evidencia ainda mais isso. Inicialmente, é necessário que sejam avaliados esses pontos para que se possa aproveitar as oportunidades geradas, que são diversas. De forma geral, acredito que as cooperativas de crédito têm a possibilidade de conhecer ainda melhor seus associados, assim como clientes de instituições financeiras tradicionais podem ter acesso facilitado aos diferenciais das cooperativas, como taxas e condições atrativas. Também há muito espaço para as cooperativas realizarem parcerias que lhes permitam não só aprimorar as ofertas como também ampliar portfólio com investimentos e tempo de desenvolvimento provavelmente menores.

Quais são os desafios regulatórios de hoje para o open banking?

M.A.: Ao final da construção das fases previstas, o open banking brasileiro será possivelmente a mais ampla solução do tipo no mundo. E, provavelmente, também a feita em menor tempo. As instituições participantes são diversas em natureza, porte e estrutura, o que torna o desafio regulatório enorme. 

Acomodar todas estas particularidades em tão pouco tempo tem sido um desafio que, até aqui, vem sendo bem conduzido pela estrutura inicial do open banking onde as cooperativas são representadas pela OCB com o mesmo poder de decisão que as grandes instituições financeiras.

C.B.: Acreditamos que, antes do lançamento do open banking, o ambiente regulatório foi adequadamente preparado. Os maiores desafios talvez passem mais pela adequação às mudanças do que às regras propriamente. A grande questão será garantir a privacidade dos dados de consumidores trocados pelas instituições financeiras. E, para dar as garantias legais a esse mercado em expansão, a criação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), em agosto de 2018, foi fundamental. As regras da LGPD estabelecem procedimentos para o tratamento de dados pelas organizações e regulamentam processos que envolvam a utilização de informações pessoais, desde a maneira como são coletadas, classificação, utilização, processamento, armazenamento e compartilhamento, até a sua eliminação. Oferecem, assim, a base legal para que os dados dos titulares possam ser compartilhados entre instituições financeiras com segurança jurídica, e apresentam-se como um importante marco da evolução do ambiente regulatório do país. Consequentemente, a LGPD é um exemplo de medida favorável à implantação do open banking e outras inovações no SFN.

É claro que em um novo ambiente sempre vão surgir questões também novas, que acompanham o avanço da tecnologia e o comportamento das pessoas; então, é uma evolução constante, mas o Banco Central tem realizado os processos com muita profundidade e qualidade, o que dá segurança para as instituições e os consumidores.

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Conheça o cronograma de implantação do open banking no Brasil

O processo de implementação do open banking foi dividido em quatro etapas e teve início em 30 de novembro do ano passado. A conclusão está prevista para outubro de 2021. Confira:

Primeira fase: Dados Públicos das Instituições Financeiras

Todas as instituições financeiras disponibilizam dados de forma padronizada. Nessa fase, devem ser disponibilizadas as informações de seus canais de atendimento e de seus produtos e serviços, incluindo as taxas e tarifas de cada item ofertado.

Para o cliente: podem surgir novas comparações de produtos e serviços financeiros, o que facilitará a escolha de produtos de acordo com as necessidades de cada cliente.

Segunda fase: Compartilhamento de dados do consumidor

O consumidor poderá compartilhar seus dados (cadastros, transações em conta, informações sobre cartões e operações de crédito) com as instituições de sua preferência. Tudo é feito por meio de consentimento, que pode ser revogado a qualquer momento.

Para o cliente: novos produtos e serviços, mais personalizados e acessíveis, podem ser acrescentados. Mas o compartilhamento de dados entre instituições só será possível por meio de consentimento.

Terceira fase: Os consumidores terão acesso a serviços financeiros como pagamentos e encaminhamento de propostas de crédito, sem a necessidade de acessar os canais das instituições financeiras com as quais eles já têm relacionamento.

Para o cliente: nesta fase, poderão ser enviadas e contratadas propostas de crédito de outras instituições de escolha do consumidor, que ganha autonomia no acesso a serviços financeiros.

Quarta fase: Inclusão de novos dados que poderão ser compartilhados, além de novos produtos e serviços, tais como contratação de operações de câmbio, investimentos, seguros e previdência privada.

Para o cliente: os consumidores passam a ter o controle do compartilhamento de uma gama maior de informações, o que pode levar à criação de produtos ainda mais personalizados para cada necessidade.

FONTE: Open Banking Brasil

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Esta matéria foi escrita por Paula Andrade e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Colaborar é inovar

Para ampliar a disseminação de conhecimento sobre inovação, o Sistema OCB criou um programa de capacitação de agentes de inovação, realizado em parceria com o Instituto Superior de Administração e Economia (ISAE Brasil). Além disso,, criou o inova.coop.br site que disponibiliza cursos e outros materiais, como e-books, matérias, entre outras ferramentas de capacitação. Até o final de 2021, o site terá 14 cursos.

O site também reúne cases de inovação no cooperativismo de todas as regiões do país e do mundo em uma mesma plataforma, com os contatos dos agentes responsáveis para promover a intercooperação.

Entre os cases de sucesso elencados no InovaCoop — que já têm inspirado outras experiências inovadoras no país — está o da Agência Mais, a primeira unidade de atendimento digital do cooperativismo de crédito brasileiro

Idealizada pela Unicred União, que atua em Santa Catarina e no Paraná, a iniciativa é um dos exemplos de inovação pré-pandemia e ficou em segundo lugar no Prêmio SomosCoop de 2020, na categoria Inovação.

A agência virtual foi criada em 2016 para viabilizar o atendimento de cerca de 5 mil cooperados que não frequentavam as agências físicas e preferiam ser atendidos de forma remota. Transpostos os desafios iniciais de implantação, a Unicred União conseguiu fechar duas agências físicas, o que gerou economia significativa de recursos e aumentou a eficiência do atendimento, que foi ampliado para diferentes canais, como vídeos, chats, telefone e e-mail. 

Apesar dos meios virtuais, o atendimento não deixou de ser humanizado, pois o cooperado não precisa passar por opções gravadas como robôs ou call centers com atendentes que não têm autonomia para atender a demanda do cliente. Ele consegue falar diretamente com o gerente da conta ou outro colaborador que possa resolver seu problema.

No lugar das agências desativadas, agora existe apenas a Agência Mais, instalada em Joinville, que conta com uma estrutura que permite geração de energia solar, entre outras vantagens de cunho sustentável. 

Em razão do sucesso, a agência já recebeu mais de 150 visitas e seu benchmarking foi compartilhado com outras cooperativas de crédito do país, promovendo outro princípio do cooperativismo: a intercooperação.

 A história e toda a estratégia operacional para implantação da Agência Mais também podem ser conhecidas pelo livro Feito à Mão – As pessoas no centro das transformações, escrito pelo Marcelo Vieira Martins, CEO da Unicred União.

Somos um case de pioneirismo e inovação, pois na época não havia nada parecido no cenário do cooperativismo de crédito do país. Os resultados que obtivemos falam por si: mais de 4,5 mil cooperados atendidos pela Agência Mais com índice de satisfação superior a 94%, geração de novos negócios, redução de custos com estruturas físicas e uma mudança de mindset que pavimenta o relacionamento do futuro para a nossa cooperativa”, afirmou Vieira.

Vale destacar: essa experiência inovadora permitiu melhor adaptação da cooperativa às medidas de distanciamento social impostas pela pandemia. No último ano, a Agência Mais ampliou o atendimento para todos os 19,5 mil cooperados da Unicred União, dobrou o número de operações e aumentou o volume de negócios.

RESPEITO E CONFIANÇA

Para profissionalizar cada vez mais seus projetos de inovação, a Unicred União tem trabalhado para organizar uma estrutura específica para apoiar ideias e projetos inovadores. Por isso, ela lançou, no início deste ano, o programa Motor 2, que reúne os recursos necessários para o desenvolvimento de um projeto de inovação, incluindo a formação de equipe exclusiva para o projeto e mentoria para colocá-lo em prática. 

Crédito: Mundo Coop | Maysse Paes Honorato, Head de Comunicação da Unicred União

A capacitação é dada por um consultor especializado em inovação e outros temas aos gestores, que multiplicam o conhecimento para suas equipes. Até então, os projetos inovadores da cooperativa eram desenvolvidos na base da tentativa e erro. Com a capacitação das equipes, a ideia é que os projetos antes de serem aplicados totalmente na prática passem por um tempo de maturação até apresentarem condições de gerar resultados e metas factíveis. 

Desenvolvemos dentro do motor 2 um time que fica pesquisando, estudando na nossa atuação do dia a dia o que pode ser implantado, o que pode ser melhorado e novas estratégias de negócio”, explica Maysse Paes Honorato, colaboradora da área de comunicação da Unicred União.

Atualmente, a equipe está analisando 27 projetos para saber quais poderão ser aplicados no dia a dia da cooperativa. A seleção considera como o projeto levará a inovação para os processos da organização, de uma forma mais abrangente.

“Depois da mentoria, já temos um olhar diferente sobre alguns dos projetos. A capacitação traz dados de mercado, novas formas de implantação, uma forma muito mais estruturada de gestão", conclui Maysse.


Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Uma história brasileira

“Onde é que mora a Maria Vaqueira?”, perguntava Erlane Mariana dos Santos, na tarde de 6 de janeiro de 2020, pelas ruas do Assentamento Esperança, em Curimatá, interior do Piauí. Maria Vaqueira é muito conhecida na região por participar de cavalgadas e derrubar bois em vaquejadas, mas Erlane, sua filha primogênita, só iria conhecê-la naquele dia. Ela já estava com 27 anos de idade. Agora tem 28. 

A história que vamos contar aqui é a de muitas brasileiras: Erlane nasceu no Nordeste, mas, ainda menina, mudou-se para outro estado (no caso, Goiás), com o pai. Da mãe — que ela só conheceu adulta, como mostraremos ao longo desta reportagem —, ela mal sabia o nome. Não por desejo da progenitora, mas por conta do pai e do avô, que tentaram esconder da vizinhança que Maria, então com 14 anos, tinha engravidado tão nova. 

Acontece que, até serem resolvidas, muitas histórias gostam de se repetir. E, tal como a mãe, Erlane engravidou na adolescência. Começava ali a saga como chefe de família e responsável pelo sustento de si mesma e dos filhos.

Quatro meninos não é fácil”, mensura, com toda a razão. Com o início da pandemia do novo coronavírus, as coisas, que já eram difíceis, ficaram ainda piores. 

Foi nesse momento delicado que chegou o Agro Fraterno — programa nacional de arrecadação e distribuição de alimentos idealizado pelo Governo Federal e abraçado pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), pelo Instituto Pensar Agro (IPA) e por outras entidades do setor. Foi graças a ele que Erlane conseguiu manter a comida na mesa de sua família.

“A cesta de alimentos do Agro Fraterno foi muito bem-vinda.  Como não tenho salário fixo, ela me ajuda até eu receber uma quantia boa para sustentar a casa, comprar remédios e cuidar dos meus meninos”, alegra-se. “Eu quebrei esse ciclo da minha família de filhos criados longe da mãe. Tudo que eu faço é por eles. Toda a luta é por eles.”

A FOME NÃO ESPERA

Lançado no mês de  maio,  o Agro Fraterno é um projeto contínuo de combate à fome em todo o Brasil. Seu objetivo é levar alimento às famílias carentes afetadas pela pandemia da Covid-19, por meio da doação de produtores rurais, empresas e cooperativas do Ramo Agropecuário. A meta das entidades envolvidas é ultrapassar 1 milhão de cestas distribuídas até o fim do ano. O material arrecadado é distribuído de acordo com a demanda de cada município. 

“Cada um colaborando, vamos diminuir o sofrimento dessas pessoas que passam fome em um país tão rico como o nosso, que é o celeiro do mundo. É o campo gerando emprego e renda, mas também ajudando a população das cidades neste momento tão difícil por que passa todo o nosso país”, declarou a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Teresa Cristina, na cerimônia de lançamento do programa. 

Não há uma data-limite para cooperativas, instituições, empresas e agentes que queiram realizar suas doações. Para participar, basta procurar a secretaria de assistência social do seu município.

“A gente sabe que a fome é urgente, e não existe uma data a curto prazo para esse problema acabar. Nós estamos vivendo um momento de crise sanitária e econômica; então, o desemprego está aí. Por isso não colocamos um prazo final na campanha”, explica Tânia Zanella, gerente-geral da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). 

COOPERAR MUDA VIDAS

O cooperativismo ajudou a melhorar a vida de Erlane muito antes do Programa Agro Fraterno. Durante algum tempo, ela trabalhou cuidando da casa e da filha de Alessandra Alves, presidente da Cooperativa de Trabalho Especial Liberdade Para Sonhar (CTELS), porém depois de se casar e ter filhos, teve de largar o emprego para cuidar da prole. 

Enquanto trabalhou com Alessandra, Erlane aprendeu um pouco sobre cooperativismo. A ex-patroa — e hoje amiga de Erlane — começou a trabalhar aos 16 anos de idade, com reciclagem, no Lixão da Estrutural, uma região administrativa do Distrito Federal. Depois de sete anos na linha de produção, começou a fazer cursos e se capacitar; logo se tornou presidente da cooperativa em que trabalhava, cargo que ocupou por seis anos. Depois, cumpriu mais quatro anos de mandato como presidente da Renove, e um na Central das Cooperativas de Trabalho de Materiais Recicláveis do DF (Centcoop). 

Disposta a fazer ainda mais, resolveu abrir a própria cooperativa: a CTELS, que trabalha com reciclagem e opera em um complexo na Estrutural com outras cooperativas que fazem parte da Centcoop, sediada ao lado da Estrutural. 

Erlane acompanhava toda essa movimentação a distância e, após se separar do marido, decidiu pedir emprego à amiga. “Alessandra, você ainda está mexendo com materiais?”, perguntou. A resposta era sim, e a vaga de Erlane estava garantida. Não como empregada, mas como cooperada. 

“A gente começou em um galpão, eu e mais quatro meninas. Um galpão e um caminhão, catando e separando material. E eu fui só aprendendo sobre o tipo de material e como trabalhar direitinho.” 

Hoje, a CTELS tem 30 cooperados: 20 mulheres, que trabalham nas esteiras selecionando os materiais, e 10 homens, encarregados de carregá-los para os caminhões. No entanto, as mulheres não se fazem de rogadas quando precisam, eventualmente, carregar os pesados sacos de materiais reciclados. “Nós somos um grupo muito unido. Minhas colegas, como eu, são todas guerreiras e mães de família’, explica Alessandra. 

Durante a pandemia, os rendimentos dos cooperados da CTELS caíram muito e a cesta de alimentos do Programa Agro Fraterno foi crucial para garantir a segurança alimentar do grupo de cooperados. 

Erlane, por exemplo, recebeu alimentos doados por outras cooperativas vinculadas à Organização das Cooperativas do Distrito Federal (OCDF). Nesta unidade da Federação, quem está à frente das ações do Agro Fraterno é Alessandra, gerente administrativa da OCDF e integrante do conselho administrativo dessa unidade estadual. Por lá, foram arrecadadas 278 cestas básicas, que beneficiaram igual número de famílias. 

De acordo com Tânia Zanella, gerente-geral da OCB, a estratégia de organizar as doações por meio das cooperativas, nos diferentes estados, ajuda a fazer esses alimentos chegarem a quem mais precisa. Afinal, as cooperativas conhecem de perto a realidade das comunidades onde estão situadas. 

Nós sabíamos que, já em 2020, as cooperativas brasileiras estavam mobilizadas em torno da questão da doação — em especial, a de alimentos. Foi natural percebemos que o cooperativismo poderia protagonizar uma grande doação de alimentos em 2021, capaz de beneficiar os milhares de brasileiros que perderam emprego e renda durante a pandemia da Covid-19”, conta a gestora.  

SORORIDADE 

Como a cooperativa de Alessandra e Erlane ainda é nova e pequena, ela não recebe tanto material para reciclar. Por conta da pandemia, o trabalho ficou ainda mais escasso e os cooperados trabalham apenas algumas vezes por semana,  recebendo uma renda média de R$ 600 por mês. 

Apesar dos rendimentos ainda baixos, ambas gostam do trabalho. “Eu gosto do que eu faço, não vou mentir, não. Tem gente que acha que é mexer com lixo, mas não é. Além de fazer a coleta seletiva, nós batemos de porta em porta, falamos sobre a importância da reciclagem. Atualmente, é enterrado muito resíduo; então, a sociedade também ganha muito com o nosso trabalho”, conclui Alessandra.  

Para completar a renda da família, Erlane precisa recorrer a outros expedientes. Uma das fontes que auxiliam bastante é o Bolsa Família, programa de distribuição de renda do governo pelo qual ela recebe pouco mais de R$ 400. 

Além disso, todo domingo, ela acorda às cinco da manhã para montar um bazar na Feira da Estrutural. Lá, vende objetos ainda em bom estado que encontra na coleta de materiais, ou que foram doados pelas amigas. São caixinhas de óculos, capinhas de celular, sapatos, bolsas, todo tipo de coisa. Os produtos saem rápido, mas mais rápido ainda saem as mudinhas de plantas — principalmente suculentas, que ela mesma produz em casa, a partir de uma matriz. Alguns feirantes compram essas mudinhas aos lotes para revender ali na feira mesmo. Ela tem o maior amor por essas plantinhas. Com o dinheiro que ganha na feira, já compra ali arroz, feijão e uma verdura. E ainda consegue guardar um pouquinho para comprar os óculos do filho Davi e ajudar na construção da casa. Ela e os filhos moram em um barraco de madeira com um cômodo e um banheiro, do qual ela se orgulha. 

“Hoje eu sinto que eu estou na glória, porque eu estou no que é meu, juntando cada centavo para construir uma casa melhor pra meus filhos. Eu agradeço a Deus todos os dias pelo meu cantinho”, afirma. 

Apesar de só ter podido estudar até a 8ª série, Erlane valoriza muito os estudos. Quando as crianças começaram a precisar dela para estudar, a jovem decidiu se matricular novamente na escola. “Eu ainda tenho a chance”, pensou. “Tenho amigas mais velhas que são exemplo para mim, que estão na faculdade. Então, eu pensei: Por que eu não posso também?”. E voltou a correr atrás. Recentemente, ela se inscreveu no Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), para concluir o ensino médio e tentar fazer o ensino superior no futuro. Prestará a prova agora em agosto, e estuda sempre que tem um tempinho, além de acompanhar o noticiário. 

REENCONTRO

Entre julho e agosto de 2020, o pai de Erlane foi visitá-la e lhe trouxe um grande presente: o número de telefone da mãe que ela não conheceu. “Ele tinha muita mágoa dela, mas, depois, passou”, Erlane explica. 

De posse daquele número, ela respirou fundo, tomou coragem e ligou. “Ela me disse que não queria ter me deixado, que foi tudo uma enrolação do pai dela com o meu pai. Desde que vim morar aqui, eu fiquei isolada dela. Só me diziam que eu não tinha mãe. Quando conversei com ela, ela chorou, se emocionou”, recorda.

Mesmo sem condições, Erlane juntou o dinheiro do Bolsa Família, pediu ajuda ao pai dos meninos e foi para o Piauí passar dois dias com a mãe. 

Onde mora a Maria Vaqueira?”, perguntava ela pelas ruas do Assentamento Esperança, em Curimatá, no dia em que chegou, e facilmente localizou a moradia. Quando andavam pelas ruas, Maria Vaqueira era reconhecida e cumprimentada por todos. 

Erlane descobriu que tinha vários irmãos que vieram depois dela, e eles fizeram questão de conhecê-la. Descobriu também que dois desses irmãos moravam em Taguatinga, outra região administrativa do Distrito Federal — portanto, muito próximos dela. Agora eles mantêm contato e se visitam de vez em quando. 

Mas, acima de tudo, Erlane descobriu, além da impressionante semelhança física com a mãe, que havia herdado dela a coragem e a disposição de lutar para melhorar de vida. “Minha mãe me contou histórias do que ela passou pra ter um pedaço de chão dela,  que é só um assentamento, mas é dela. Até chegar onde ela está hoje, foi todo esse sofrimento. E eu também, desde pequena, na luta. Eu me reconheço na luta dela, em ser batalhadora.” 



Esta matéria foi escrita por Devana Babu e está publicada na Edição 34 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


A irmã brasileira de Sunchales

Quando os sunchalenses se preparavam para inaugurar seu Monumento ao Cooperativismo, em 2006, convidaram o então presidente da Aliança Cooperativa Internacional, o italiano Ivano Barberini, para participar do evento, e anunciaram a homenagem como a primeira do tipo em todo mundo. Na ocasião, foram avisados por Barberini que, na verdade, se tratava do segundo, porque já havia no Brasil, desde 2002, um monumento que celebrava o cooperativismo, na cidade de Nova Petrópolis, no interior do Rio Grande do Sul. 

O que poderia ser uma história de rivalidade sobre a originalidade dos monumentos, abriu portas para uma trajetória de cooperação entre as duas cidades, com visitas mútuas, trocas de experiências e o estabelecimento formal de uma irmandade entre Sunchales e Nova Petrópolis desde 2010. 

Assim como a irmã argentina, Nova Petrópolis é um berço do cooperativismo, sede da primeira cooperativa de crédito do país, a Sicredi Pioneira RS, criada em 1902. O intercâmbio com Sunchales levou a cidade gaúcha a buscar e conseguir o título de Capital Nacional do Cooperativismo do Brasil, reconhecido por lei federal em 2010. 

Rivalidade não existe quando a gente fala em cooperativismo, em amizade, em cooperação, em trocas. Nós aqui reconhecemos os argentinos e chamamos eles de verdadeiros irmãos. Ainda não conheci outro lugar no mundo em que houvesse o humanismo, a receptividade, o carinho que têem os sunchalenses conosco quando chegamos lá”, conta o presidente da Casa Cooperativa de Nova Petrópolis, Mário Konzen. 


INTERCÂMBIO


A criação da  Casa Cooperativa de Nova Petrópolis é, inclusive, um dos frutos da cooperação entre as cidades- irmãs. Outra iniciativa da integração foi o estabelecimento das cooperativas escolares na cidade gaúcha, repetindo o sucesso da experiência argentina.

Esse modelo que a gente trouxe de lá e adaptou à nossa realidade foi o grande capital dessa troca, aprendizado e convivência com os argentinos. Temos muitos jovens hoje que estão transformados para o bem, têm conhecimento do cooperativismo desde crianças e não perdem mais essa característica. Quando chegam nas empresas, são logo vistos como pessoas diferentes, com mais capacidade de liderança, de iniciativa e de saber o que é cooperar”, conta Konzen. 

Também inspirados na experiência sunchalenses, os gaúchos criaram a Federação de Cooperativas Escolares Pioneira, que hoje reúne 28 cooperativas de estudantes de várias cidades do estado. 

Com as fronteiras parcialmente fechadas e as restrições impostas pela pandemia, as atividades entre as cidades- irmãs cooperativistas estão reduzidas à troca de e-mails e reuniões on-line. Mas as duas partes esperam poder retomar em breve os planos em conjunto, em especial o intercâmbio de estudantes cooperativistas dos dois países. 

“Havia projetos iniciados, como de intercooperação de jovens que viajariam e passariam pelo menos uma semana convivendo e atuando dentro de atividades no outro país, mas não evoluiu porque começou a pandemia. Também foram interrompidas as visitas anuais, a troca de grupos que iam daqui para lá;, tudo está interrompido, mas esperamos que logo possa ser retomado”, conclui Konzen. 


Esta matéria foi escrita por Luana Lourenço, Correspondente da Saber Cooperar na Argentina e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Enfrentando a pandemia

Segundo Raul Colombetti, da Casa Cooperativa, se por um lado a pandemia trouxe dificuldades, ela também reafirmou o papel dos valores cooperativistas e da economia social para enfrentar as adversidades. 

Sunchales passou os primeiros meses da pandemia sem registrar nenhum caso de coronavírus, mas desde o começo do lockdown foram organizadas coletas e doações, principalmente das grandes cooperativas, para fortalecer o sistema de saúde local para enfrentar o vírus, inclusive com a criação de novos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).  Em outra frente, a Cooperativa de Águas passou a oferecer facilidades para pagamento de contas e impostos.  

O ano de 2020 demonstrou que nós, entidades da economia social, temos muito o que fazer e acompanhar neste processo que estamos atravessando, pensando em novas formas de fazer cooperação”, diz Colombetti. 

Para Ariel Guarco, da Aliança Cooperativa Internacional, apesar de terem sido tão atingidas quanto as empresas convencionais pela brusca parada da atividade econômica durante a pandemia, as cooperativas demonstraram mais resiliência e compromisso com as comunidades no enfrentamento da crise. Segundo ele, o modelo cooperativista deve servir de inspiração para a recuperação mundial pós- coronavírus. “Devemos apostar em modelos empresariais em que o motor não seja o egoísmo, e sim a ajuda mútua. Temos que colocar em funcionamento a ajuda mútua e a democracia para que as comunidades direcionem seu trabalho e seus recursos à construção de uma economia que cuide das pessoas e do meio ambiente. A boa notícia é que isso é possível. Isso é o que fazemos nas cooperativas, é o que fazem 1,2 bilhão de pessoas associadas às 3 milhões de cooperativas existentes no mundo. Esse é o momento de valorizar nossas propostas e nossa experiência.” 


Esta matéria foi escrita por Luana Lourenço, Correspondente da Saber Cooperar na Argentina e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


A força das cooperativas escolares da Argentina

As cooperativas escolares acabaram se transformando em uma marca do cooperativismo sunchalense, com destaque, inclusive, no exterior. Em março, a cidade foi reconhecida pela organização Cooperativa de las Américas como "Cidade Desenvolvida em Cooperativismo Escolar". 

Cerca de 3,5 mil estudantes fazem parte dos projetos, que estão presentes em quase todas as escolas da cidade – urbanas, rurais e de ensino especial – exceto em uma, que foi criada no fim de 2019 e, por causa da pandemia, ainda não teve sua cooperativa formada. 

Segundo a coordenadora da FeCoopES, Julieta Camino, em cada cooperativa, os estudantes decidem que atividades ou produtos vão desenvolver, e participam de todas as etapas, inclusive da administração da entidade. 

A participação nas cooperativas muitas vezes funciona como um estágio, porque eles aprendem a gerenciar estoques, a negociar com fornecedores. Há muitos estudantes que fizeram parte de cooperativas escolares e hoje estão em grandes empresas.”

Entre as atividades desenvolvidas atualmente nas 17 cooperativas escolares de Sunchales estão a produção de itens de higiene, artigos de papelaria, objetos de decoração, e a venda de alimentos e material escolar. A renda é  reinvestida na compra de matérias-primas ou em benfeitorias para as escolas, como bebedouros. Também há estudantes que se dedicam a hortas nas escolas e outros que criaram uma rádio interna.

Os alunos cooperativistas recebem apoio financeiro da Casa Cooperativa e da Fundação Sancor, além de recursos de um fundo municipal formado por 3% do valor dos impostos pagos pelas cooperativas ao governo local. 

A estudante universitária Jenifer Molina fez parte de uma cooperativa escolar, e integrou o conselho da FeCoopES e diz que a experiência foi um diferencial em sua formação. “O que aprendi vai muito além da escola, a cooperativa é um outro ambiente. Os valores que aprendemos vão muito além da teoria, passam a ser parte da nossa vida. Levo agora para a faculdade e, com certeza, para a vida profissional. Eu não seria a pessoa que sou hoje sem esse aprendizado, inclusive sobre como ter voz, saber falar sobre o que queremos.” 

OLHOS NO FUTURO


Outra iniciativa pioneira de Sunchales para a educação é o Instituto Cooperativo de Enseñanza Superior (ICES), criado em 1986 para atender à demanda por profissionais de informática que trabalhassem com os computadores que nessa época estavam chegando às cooperativas. 

Trinta anos depois, o objetivo foi alcançado, segundo Román Frutero, diretor do instituto, e os analistas de sistemas que se formam na instituição, em geral, são absorvidos por empresas e cooperativas locais.

Agora, as novas necessidades aumentam a demanda por desenvolvedores, e já começamos a oferecer capacitação nessa área.” 

O ICES disponibiliza oferece educação superior por meio de tecnicaturas (o equivalente aos cursos de tecnólogos no Brasil) e universitários, em convênio com universidades da região. Alguns cursos têm ligação direta com o cooperativismo, como o de Gestão das Cooperativas e Mutualistas, e o Curso Superior de Cooperativismo.

Idealizado pela Casa Cooperativa de Sunchales, desde 2008 o ICES está sob a gestão da Fundação Sancor Seguros, e em dezembro do ano passado ganhou uma sede moderna e funcional às margens da rodovia federal RN 34, em um prédio com ares futuristas que chama a atenção em meio à paisagem rural da região. 

A construção faz parte de um megaprojeto que também inclui a futura sede para o Centro de Innovación Tecnológica, Empresarial y Social (CITES), uma incubadora de empresas de inovação lançada em 2015 pela megacooperativa seguradora. Atualmente, há 25 empresas no projeto nas áreas de tecnologia, fármacos, medicina, agropecuária, nanotecnologia, dentre outras. Uma delas é a startup Llamando al doctor (Telefonando para o médico, em tradução livre), que conecta médicos e pacientes por videoconferência para atendimento inicial. Lançado em 2018, o aplicativo foi providencial após o início da pandemia do coronavírus e passou a ser usado pelo plano de saúde da Sancor Seguros para atendimentos a afiliados em todo o país. 


Esta matéria foi escrita por Luana Lourenço, Correspondente da Saber Cooperar na Argentina e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Sunchales: a capital argentina do cooperativismo

Imagine uma cidade em que o abastecimento de água é feito por uma cooperativa, em que todas as escolas têm cooperativas de estudantes, e onde três em cada dez habitantes trabalham direta ou indiretamente para entidades associativas. Esse lugar existe e fica no interior da Argentina: Sunchales, declarada a capital do cooperativismo do país em 2005. A cidade é reconhecida por seu histórico e pelo desenvolvimento baseado na economia social, dentro e fora do território argentino, e tem até uma “cidade-irmã” no Brasil. 

A 600 quilômetros de Buenos Aires, na província de Santa Fé, Sunchales tem 26 mil habitantes, cerca de 8 mil deles em postos de trabalho direta ou indiretamente ligados ao cooperativismo. Logo na entrada da cidade, no meio de uma avenida cercada por praças, está uma de suas marcas: o Monumento Nacional ao Cooperativismo, erguido em 2006, o segundo no mundo – o primeiro está em Nova Petrópolis, no Rio Grande do Sul. 

Com sete colunas, cada uma representando um dos Princípios do Cooperativismo, a obra também destaca sete valores para que os ideais cooperativistas sejam alcançados: paz, ajuda mútua, equidade, justiça, liberdade, solidariedade e responsabilidade. A construção também exibe diversas placas que marcaram visitas de importantes entidades do movimento cooperativista internacional.

Simpática como as cidades do interior, Sunchales tem ruas limpas e arborizadas, um único semáforo, e uma ampla praça central que ocupa quatro quadras —– com muitas árvores, parques e até uma estátua de Mafalda, a mais famosa personagem do cartunista argentino Quino. 

Muito além de placas e monumentos, o pequeno município tem o cooperativismo presente no dia a dia. Além de o abastecimento de água de todas as casas ser feito pela Cooperativa Águas Potáveis de Sunchales, criada em 1957, a cidade tem entidades associativas agrícolas, industriais, de seguros, serviços, trabalho, saúde, educação, cultura, comunicação audiovisual, e de capacitação e pesquisa. O impacto econômico dessas atividades é tão relevante que faz com que 83% do Produto Interno Bruto (PIB) municipal sejam relacionados a cooperativas, associações mutualistas e fundações, num total de 4,8 milhões de dólares por ano. 

Para se ter uma ideia desse volume, basta comparar com o cenário nacional argentino, em que as cooperativas são responsáveis por cerca de 10% do PIB do país, segundo dados da Confederação Cooperativa da República Argentina (Cooperar) —— entidade de representação equivalente ao Sistema OCB. 

“Temos na Argentina 10 mil cooperativas com matrícula vigente, com 18 milhões de membros. Estão presentes em mais de duas mil localidades, nos 24 estados do país, e são a empresa mais importante em muitas pequenas cidades distantes dos grandes centros urbanos, onde, inclusive, foram pioneiras em fornecer serviços públicos como energia elétrica, água e telefonia. Hoje, essas cooperativas, que em alguns casos têm 80, 90 ou 100 anos de trajetória, estão levando internet e telefonia móvel  aos lugares mais remotos, ou seja, mantêm o mesmo espírito inovador que lhes deu origem, dando respostas às demandas atuais de suas comunidades, como no começo fizeram com serviços básicos”, compara o presidente da Cooperar, Ariel Guarco, que também comanda a Aliança Cooperativa Internacional. 

COMO TUDO COMEÇOU

A  história do movimento cooperativista em Sunchales começa com a formação de entidades associativistas a partir de 1891, por imigrantes italianos, mesmo antes da primeira Lei de Cooperativas da Argentina, de 1926. Em seguida, a partir de 1929, foram criadas as primeiras associações de produtores de leite da cidade e da região.

Mas o fator determinante para a trajetória cooperativista da cidade ocorreu em 1938, com a reunião de 16 cooperativas leiteiras em uma entidade de segundo grau, a Sancor, para juntas construírem uma fábrica de manteiga. A palavra Sancor é uma fusão dos nomes dos estados de Santa Fé e Córdoba,  de onde eram as primeiras cooperativas associadas. 

A possibilidade de venda direta, sem intermédio de empresas privadas, atraiu produtores de leite da região e levou a um rápido crescimento da Sancor, que chegou a ter mais de 300 entidades associadas. Ainda hoje — mesmo atravessando uma crise financeira que desencadeou o fechamento de fábricas e venda de ativos para saldar dívidas — a cooperativa ainda tem atuação nacional e internacional, processando mais de 750 mil litros de leite diariamente. 

Criada em 1945 como um braço da cooperativa de lácteos para atender aos associados, a Sancor Seguros teve crescimento ainda mais relevante e se consolidou como líder no mercado de seguros da Argentina, com atuação também no Brasil, Paraguai e Uruguai. Hoje, essa mega cooperativa sunchalense reúne mais de 10 empresas com atuação no mercado de seguros, planos de saúde, previdência privada, resseguros, desenvolvimento tecnológico, entre outras. 

Desde 2007, o grupo Sancor Seguros tem uma fundação, criada para apoiar projetos que fortaleçam os valores cooperativistas, com foco, principalmente, na educação. Apesar da atuação multinacional, a cooperativa manteve em Sunchales sua sede – um moderno e vistoso edifício de 8,5 mil metros quadrados — com impacto direto na economia e nos níveis de ocupação e renda per capita da cidade. 

Temos orgulho de estar no interior do interior. A Sancor Seguros se manteve em Sunchales porque aqui estão nossas raízes, nossa cultura,  nossos valores, nossa gente e nossos princípios. E desde sempre o interior inspira muita confiança. Sancor termina sendo uma grande família em Sunchales, um lugar onde se respira o sentimento cooperativista”, explica o diretor de Relações Institucionais do grupo, Osiris Trossero. 

CASA COOPERATIVA

Diante da forte presença das cooperativas na cidade, em 1979 foi criada a Casa Cooperativa de Sunchales, uma entidade de segundo grau, para representação institucional do setor e promoção da cultura cooperativista por meio da formação de lideranças. De acordo com o atual presidente da instituição, Raul Colombetti, a criação foi motivada pelo sexto princípio do cooperativismo: a intercooperação.

Como cooperativa de cooperativas, e para favorecer a intercooperação, a Casa orienta suas atividades para educar e capacitar dirigentes, jovens e adolescentes, com o objetivo de fortalecer o sistema cooperativo.” 

Atualmente, a entidade tem 33 associados: 18 cooperativas e federações, 11 associações mutualistas e quatro fundações, em diversos ramos de atuação. Segundo Colombetti, a experiência sunchalense inspirou a criação de casas cooperativas em Bahía Blanca e La Plata, ambas na Argentina, e na gaúcha Nova Petrópolis, sua cidade- irmã cooperativista.

Vale destacar: a atuação institucional da Casa Cooperativa foi fundamental para a aprovação da Lei Nacional nº 26.037, de 2005, que declarou Sunchales como capital  nacional argentina do cooperativismo. Desde 1974, a cidade tinha o título em âmbito estadual. Mas o feito que mais orgulha Colombetti é o trabalho da instituição para formação de jovens cooperativistas, que se dá, principalmente, pelo apoio às cooperativas de estudantes.

 É um programa que se estendeu por todas as escolas da cidade e da região;, depois, chegou a toda a província de Santa Fé, a outras províncias, e finalmente, a países vizinhos”, conta. Uma das entidades associadas à Casa é justamente a Federação de Cooperativas Escolares de Sunchales (FeCoopES), a primeira da Argentina, criada em 2007 para concentrar as propostas desenvolvidas pelas diferentes cooperativas de estudantes.


Esta matéria foi escrita por Luana Lourenço, Correspondente da Saber Cooperar na Argentina e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Inovar não é mais uma escolha

APRENDIZAGEM TRANSFORMADORA
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Atenta à crescente demanda cooperativista por inovação, a OCB lançou em fevereiro deste ano, em parceria com o Instituto Superior de Administração e Economia (ISAE Brasil), o Programa de Formação de Agentes de Inovação no Cooperativismo Brasileiro.

O curso é desdobramento de um programa de inovação já desenvolvido pelo ISAE, com metodologia focada no cooperativismo. Em pouco mais de três anos, ele formou mais de 1500 agentes de inovação de mais de 220 cooperativas, em sete estados.

Nossa capacitação tem o propósito de fomentar cultura de inovação nos ambientes das cooperativas de diversas formas, uma delas é o envolvimento e a abertura dos espaços para que mais colaboradores tenham informação e entendam realmente o que é inovação. Muita gente quando pensa em inovação, pensa em tecnologia. Esse é um tabu que precisamos romper”, explica Thiago Martins, coordenador do programa.

O conteúdo do curso foi desenvolvido com foco na transformação do modelo mental dos participantes e com o objetivo de preparar os colaboradores para atuar em contexto de mudanças, como o da pandemia. Ele está dividido em quatro módulos, chamados de trilhas do conhecimento. 

O primeiro deles é comum a todas as turmas e tem o objetivo de diagnosticar as principais habilidades dos alunos, como liderança, espírito empreendedor, empatia, colaboração e senso de urgência. No segundo, são apresentados conceitos gerais para fortalecer a base teórica no tema. 

Já no terceiro módulo, os participantes passam por um processo de gamificação depois do qual são divididos em grupos de acordo com seus perfis (se são mais idealizadores ou transformadores). Neste módulo, eles experimentam novas ferramentas que potencializam a criatividade e outras competências técnicas, como capacidade de observar, associar, questionar práticas ineficientes, experimentar coisas diferentes e fazer networking.

Por fim, no quarto módulo, é a hora da aplicação prática de todo o conteúdo absorvido no programa. Nesta etapa, os participantes são desafiados a transformar as ideias inovadoras em projetos, a criar soluções para os desafios lançados e alcançar um resultado concreto.

Agora em 2021, o curso de formação de agentes de inovação está com uma abordagem um pouco diferente. É a primeira vez que tem uma turma específica para colaboradores do Sistema OCB de todas as regiões do país. Uma segunda turma foi criada com participantes de cooperativas vencedoras da edição de 2020 do Prêmio SomosCoop – Melhores do Ano, além de representantes de confederações como o Sicoob, Sicredi, Unicred, Unimed entre outras. Cada uma delas tem 36 alunos que passarão por 192 horas de capacitação, a serem completadas no período de um ano.

GENIALIDADE COLETIVA

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Segundo a coordenação do programa, a capacitação de agentes de inovação do cooperativismo foi desenhada para aproveitar as potencialidades de cada aluno, visando a construção da chamada genialidade coletiva. 

Nós somos a soma de partes que agem, sentem e pensam de formas diferentes e quando conseguimos combinar essas partes temos um resultado inovador.  Trabalhar numa equipe com pessoas de gerações, culturas e formações diferentes é benéfico e muito importante para conseguir extrair ideias. Porque tudo começa com desafios e a partir deles captar ideias para solucioná-los. Quando a gente consegue engajar os colaboradores nessa geração de ideias, temos oportunidades de inovação”, destaca Martins.

A coordenadora do Núcleo de Inovação da OCB, Samara Araújo, reforça que a formação tem o objetivo de tornar os agentes de inovação aptos a apoiar as cooperativas na solução de seus problemas e responder aos estímulos e transformações que estão acontecendo no mundo.

A OCB está oferecendo um serviço para auxiliar nossas cooperativas a entregarem serviços e produtos de qualidade e a melhorarem a instituição como um todo. Se não aprendermos a lidar com o novo, não tem como seguir em frente neste mundo que se transforma todo dia. Então, capacitação é o caminho para o sistema, para as cooperativas e para nós, como pessoas e profissionais”, afirmou.

Samara é uma das alunas do programa de formação de agentes de inovação lançado este ano. Para ela, a oportunidade tem sido muito rica e tem rendido bons frutos, além de novas conexões com diferentes ramos do cooperativismo.

O que mais me impactou até agora foi o ambiente multidisciplinar. Na turma temos cooperativas de agro, crédito, de saúde, transporte, infraestrutura de várias regiões do país. Estou aprendendo muito com essa diversidade. Estar nesta capacitação com outras pessoas do cooperativismo é uma experiência bem rica e a chance de ter impacto é muito maior”, relata.

A coordenadora destaca, ainda, que o curso pretende que os participantes compartilhem o conhecimento adquirido com outros colaboradores e cooperados, reforçando o espírito de colaboração do cooperativismo.

Vandalva é pedagoga de formação e atua no cooperativismo de crédito há mais de 20 anos. Ela ingressou no programa regional do ISAE em outubro do ano passado para se preparar frente aos desafios impostos pela pandemia do coronavírus.

Eu sou da geração do telefone orelhão de moedinha, sempre fui arredia às redes sociais e pensava que inovação tinha a ver só com questões tecnológicas. Eu sabia que precisava me atualizar nisso. Daí comecei a fazer o curso. O interesse surgiu da necessidade de aprofundar em inovação e ver como esse conceito se materializa na nossa prática”, conta.

Vandalva já ocupou diferentes cargos na cooperativa e relata ter vivenciado ao longo de sua trajetória situações de cunho inovador, mas que não eram organizadas e sistematizadas para gerar resultados mais perenes.

“O curso me fez entender que a inovação não é uma moda, uma tendência, é uma necessidade, porque os cooperados estão cada vez mais exigentes, querendo resultados mais ágeis e entregas mais eficientes. Precisamos inovar nas soluções. As mudanças estão acontecendo e para os problemas atuais não cabem as soluções do passado”, declara Vandalva.

Como presidente, um de seus maiores desafios foi o processo de elaboração do planejamento estratégico para os próximos 10 anos da organização e a necessidade de ajustar as metas de acordo com a nova realidade de 2020. 

O Sicoob Coopere também foi desafiado a se relacionar de forma remota com os 45 mil cooperados e manter de forma ágil a prestação de serviços e as respostas aos problemas do dia a dia. 

Pensávamos que a pandemia passaria em alguns meses, diagnosticamos vários problemas na elaboração do planejamento estratégico e os projetos de resposta ficaram paralisados porque foram todos idealizados para serem realizados presencialmente”, relata.

Além da presidente, o Sicoob Coopere tem mais dois colaboradores participando da capacitação. Segundo Vandalva, eles encontraram no curso não só conhecimento, mas também uma grande oportunidade de firmar parcerias com outras cooperativas que já tem soluções prontas possíveis de serem aplicadas no Sicoob Coopere.

“O curso tem nos ajudado a redimensionar os projetos da cooperativa diante desse novo jeito de viver, de comunicar e se conectar com as pessoas e nos motivou a buscar ajuda. E fez a gente entender que inovação não é uma escolha, agora é uma necessidade para encontrar a luz para continuar caminhando. É um processo sem volta, a pandemia só acelerou”, completa.



Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Antenados com o futuro

Um caminho sem volta. Mais de um ano após o início da pandemia do coronavírus no Brasil, não há uma pessoa, empresa, governo ou nação que não tenha passado por algum tipo de transformação. Reinventar processos, modernizar produtos, atualizar planos, ousar, foram algumas das expressões mais ditas nos últimos meses. Em todos os modelos de negócio, incluindo o cooperativismo, inovar tornou-se um requisito essencial para o desenvolvimento e manutenção do trabalho. Prova disso é que 84% das cooperativas brasileiras consideram a inovação fundamental e já incluíram o tema no planejamento estratégico da organização, como mostra a pesquisa inédita realizada pelo Sistema OCB sobre o assunto.

O estudo mostra que quase metade das cooperativas ouvidas pela OCB já executavam projetos de inovação antes da pandemia, principalmente nos setores de atendimento ao cliente, marketing e tecnologia. Nesse quesito, estão cooperativas de quase todos os ramos.

O problema é que apesar de valorizarem as novas tecnologias e estarem dispostas a se modernizarem, as coops ouvidas no estudo estão cientes de que têm um longo caminho a percorrer até implantarem uma cultura da inovação em suas organizações. Tanto que — em um processo de autoavaliação — foi registrada a média de 6,1 como nota dada pelas próprias cooperativas com relação ao grau de inovação de suas práticas. Para completar, apenas 3 em cada 7 as entrevistadas já tinham orçamento previsto para projetos nessa área, o que deve ser encarado como um ponto de melhoria dentro do cooperativismo. Afinal, para inovar também é preciso investir.  

Outro dado interessante do mapeamento é o que aponta que 57% das cooperativas buscaram pessoas ou empresas externas para aprender sobre os projetos de inovação. E ações de capacitação, como treinamento, cursos, consultoria e eventos, foram apontadas por 39% como a principal forma de apoiar a inovação. 

Segundo a coordenadora do Núcleo de Inovação da OCB, Samara Araujo, os resultados da pesquisa motivaram a elaboração de novas estratégias de apoio às cooperativas e nortearam a formação de um novo programa de capacitação. 

Com base nos resultados alcançados, mapeamos as principais  dificuldades das nossas coops quando o assunto é inovação. A partir daí, conseguimos desenhar ações mais assertivas. A importância dessa pesquisa é justamente fazer com que a gente consiga fazer entregas relevantes para as cooperativas”, comenta a coordenadora.


“Temos aí no mínimo 72 pessoas espalhadas pelo Brasil sendo impactadas da mesma forma que eu e isso vai ter um impacto direto no trabalho delas. A ideia é que a gente consiga pulverizar a cultura de inovação com outras pessoas, em outros espaços”, completa.

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Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Rita Mundim: a economista apaixonada pelo cooperativismo

“Quando você defende aquilo que acredita e gosta, faz isso sempre com naturalidade”. A frase da economista Rita Mundim, 63 anos, revela não só a paixão nutrida pelo cooperativismo, mas também a facilidade em difundir e dar visibilidade a um modelo de negócio que prioriza as pessoas e que busca justiça social. Pelo trabalho consistente de divulgação do movimento, ela recebeu o título de Influenciadora Coop, em votação popular realizada pelo Prêmio SomosCoop Melhores do Ano. Rita — a única mulher do trio de personalidades que recebeu a honraria — foi a mais votada.

É uma honra, mas também é uma responsabilidade. Tenho uma função de mais responsabilidade na inspiração das pessoas e na visibilidade do cooperativismo”, revela. “Quando você acredita em uma coisa, você passa a amar e a defender aquilo. Tanto com o cooperativismo quanto com a economia é assim”.

Sede de conhecimento, habilidade em ensinar e interesse pelo que é novo são características que a nossa influenciadora carrega desde cedo. As escolhas profissionais mostram um pouquinho disso. Ela chegou a fazer duas faculdades simultaneamente. Primeiro foi o Jornalismo e logo se apaixonou pelas disciplinas de economia oferecidas no curso. Passou, então, a cursar Economia também.

O objetivo inicial era ser uma jornalista especializada em economia. A falta de tempo — já que também trabalhava como professora de inglês — e as limitações financeiras acabaram fazendo ela optar por continuar apenas a graduação de Economia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).  Mas é só olhar para tudo o que ela faz atualmente para perceber que todo o desejo e empenho da juventude, aliados à vocação para transmitir informações, acabaram levando Rita para um caminho repleto de possibilidades.

MULTITAREFAS

Especialista em mercado de capitais, comentarista econômica na Rádio Itatiaia, colunista do jornal De Fato Online, professora na Fundação Dom Cabral, palestrante, consultora e administradora de Carteira de Valores Mobiliários. Rita é tudo isso e muito mais! “Nunca tive só uma atividade. Sempre tive várias. Faço muito de tudo, graças a Deus”, conta.

Solteira, ela considera cada sobrinho e sobrinha seus filhos.  Paixão? Teve várias, mas três têm espaço cativo no coração: o Galo (Atlético Mineiro), o rádio e o cooperativismo.

A paixão pelo nosso movimento é antiga. Surgiu há quase 20 anos, quando ela foi convidada pelo Sistema Ocemg para capacitar cooperativas de crédito a operarem no mercado de capitais. Dedicada a entender melhor os novos clientes, ela se debruçou sobre o nosso universo, acreditou no que viu e passou a difundi-lo espontaneamente, desde então.

As cooperativas ficaram sabendo do meu curso [que auxiliava em uma certificação] e eu fui procurada para levar essa solução para elas”, lembra. “E foi a minha sorte! Eu entrei no cooperativismo e conheci as cooperativas. Mesmo sendo economista, não conhecia esse maravilhoso mundo. Então, me apaixonei”, declara, entusiasmada.

Hoje, o cooperativismo está presente na vida de Rita de várias formas. E, por causa da especialista, chega a tantas outras vidas também. Além de ser cooperada do Sicoob, ela ministra palestras sobre estratégias econômicas para vários ramos de cooperativas; aborda o assunto em suas análises e comentários econômicos nos veículos de comunicação; além de difundir o setor para o público que ainda não conhece o modelo e estimular que façam negócios com cooperativas.

Toda essa dedicação levou Rita a ser agraciada com o título de Influenciadora Coop, na última edição do Prêmio SomosCoop – Melhores do Ano. “Eu me defino como uma pessoa apaixonada pelo trabalho e apaixonada por fazer o que gosto. E graças a Deus sempre fiz o que eu gosto”, revela.

LIGADA NA TOMADA

Crédito: Blog Sicoob Credpit

A jornalista Juliana Magalhães, que acompanha Rita há mais de 25 anos como sócia, é testemunha de todo empenho e dedicação que pautaram a vida da mineira. “Ela vive o trabalho dela e todos os projetos de uma forma muito intensa. As pessoas que trabalham com a Rita já sabem que ela é ligada no 220V. Adora trabalhar. Não tem hora para começar nem para terminar”, conta.

O resultado não podia ser diferente: a especialista tem um grande reconhecimento em Minas Gerais e no país pelo trabalho que desempenha e por sua credibilidade.

Ela é extremamente meticulosa, exigente. E principalmente: a maior qualidade dela é ser uma professora nata. Por ser muito inteligente, Rita tem um conhecimento muito amplo de tudo. Ela não retém o conhecimento para si, faz questão de repassar o que pensa e as experiências, de compartilhar o ponto de vista”, acrescenta.

O dom de ensinar e a vontade de aprender sempre mais são marcas da especialista. Assim que ela saiu da faculdade, foi convidada para dar aulas sobre mercado de capitais na Fundação Dom Cabral. À época, também foi trabalhar na bolsa de valores e em corretoras. Depois, fez mestrado em administração e duas especializações: em mercado de capitais e ciências contábeis.

A descoberta sobre o mundo cooperativo, sua visão de mundo e valores, entretanto, trouxe um verdadeiro sentido para a vida de Rita. Não à toa, ela sempre se refere ao cooperativismo como uma paixão. Para a especialista, esse é o modelo de organização econômica e social ideal e representa uma verdadeira ponte entre o comunismo e o capitalismo.

O comunismo quer distribuir, mas o que ainda não foi produzido. O capitalismo produz com muita eficiência, mas o capitalismo selvagem está criando grandes empresas e um prejuízo social. E a gente tem, no meio do caminho, o cooperativismo que reúne as pessoas para produzir e reparte aquilo que foi ganho. Então, na minha visão, é o modelo de produção viável para planeta e seres humanos”, afirma.

Para ela, nosso jeito de fazer negócios é repleto de vantagens por priorizar a melhoria de vida das pessoas e não o lucro pelo lucro. “Uma SA [Sociedade Anônima] de capital aberto reúne dinheiro e as cooperativas, não. Elas reúnem pessoas para produzir e depois distribuir o resultado dessa produção. A SA tem os sócios que não necessariamente são clientes. Nas cooperativas, não: são os cooperados que tocam o próprio negócio”, exemplifica.

A DONA DA VOZ

A voz de Rita em defesa do cooperativismo e daquilo que acredita ecoa – literalmente – nos quatro cantos do país. E vai além. Ela já foi reconhecida até na cidade norte-americana de Boston. “Fui a um mercado e o pessoal me reconheceu pela voz”, diverte-se. O fato mostra um pouco da audiência e penetração da Rádio Itatiaia, que é uma das maiores emissoras radiofônicas do país. “É principalmente por meio dela que dou voz ao cooperativismo. Sempre elogio o Dia C [o Dia de Cooperar] e eventos que as cooperativas produzem nas comunidades”, conta.

Nas análises e palestras, ela trata da dinâmica do mercado financeiro. “Como mexo com mercado de capitais, tenho que entender de mercado financeiro”, explica. E, sem falsa modéstia, admite: “Sou boa nisso. Eu gosto muito de tratar cenários, o que vai acontecer com o país ano que vem, o que pode acontecer se o juro cair ou subir. Eu ministro palestras no país inteiro sobre macroeconomia principalmente. Com essa paixão tenho aplicado muito meus conhecimentos para o cooperativismo e ressaltando para todo mundo como o cooperativismo é aderente aos valores do século 21”, conta.

Apesar de a primeira cooperativa ter nascido no século 19, os principais valores que norteiam o movimento estão cada vez mais atuais:  transparência, solidariedade, igualdade, responsabilidade, empatia e interesse pela comunidade.

Passamos praticamente um século [o século 20] sem um crescimento tão grande do cooperativismo e com uma destruição imensa do planeta”, lamenta.

Ainda segundo ela, outro argumento irrefutável sobre a importância desse modelo econômico está no fato de que comunidades com cooperativas possuem Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) maior do que aquelas que não têm. “E acho que o cooperativismo vai ter um crescimento muito grande nos próximos anos em função dessa aderência dos princípios cooperativistas aos valores deste século”, projeta. “Descobrimos, tardiamente, que a coisa mais importante que existe no planeta são as pessoas. Essas pessoas precisam ser capacitadas, essas pessoas precisam ser respeitadas, tanto socialmente quanto ambientalmente.”

Todo esse discurso não está só na teoria, na vida de Rita. Segundo a jornalista Juliana Magalhães, que convive com a economista diariamente, nossa influenciadora coop realmente tem uma ligação forte e genuína com o nosso modelo de negócios.

“Ela é uma entusiasta de fato. Desconheço alguém que fale com tanta verdade, com tanta sinceridade e com tanto amor sobre o cooperativismo. Ela realmente acredita nos princípios cooperativistas e ela leva isso para a vida profissional. Houve uma sinergia muito grande entre a Rita e o cooperativismo”, avalia.

PREMIAÇÃO

Arquivo pessoal

Ser escolhida como influenciadora pelo voto popular deu a Rita uma dimensão do reconhecimento de seu ofício junto ao cooperativismo. “Primeiro, me senti honrada pela indicação. Isso já foi um prêmio. Depois descobri a força do cooperativismo pois foi uma votação popular, construída. Então, o prêmio não é meu, mas de uma coletividade que votou no meu trabalho. É assim no cooperativismo”, ressalta.

Para Ronaldo Scucato, presidente da Ocemg — entidade que fez a indicação de Rita ao Prêmio SomosCoop Melhores do Ano (veja matéria da página XX)— a sugestão do nome da economista foi fruto da admiração de todo o sistema mineiro pelo trabalho sério e competente realizado por ela.

Rita passou a fazer análises de cenário econômico, considerando não apenas o cooperativismo de crédito, mas os resultados desse segmento para a sociedade. Hoje, ela tem grande representatividade junto às cooperativas mineiras e do Brasil, repercute nossos propósitos e é uma defensora nata do cooperativismo”, ressalta Ronaldo. “Por isso, a nossa escolha e nossa indicação: por entender que ela atendia a todos os requisitos da categoria e com louvor”.

O resultado da premiação não foi uma surpresa para o presidente da Ocemg. “Ela realmente acredita em nosso segmento e é uma incansável defensora, além de parceira, de nossas atividades. Consideramos muito merecido que ela tenha sido a Influenciadora Coop mais bem votada do país, numa disputa por votação popular com 33 concorrentes de notória credibilidade”, explica Ronaldo.

Apesar de a honraria ter chegado em tempos de pandemia, Rita já traça planos para continuar representando o cooperativismo no futuro. “Eu quero fazer algo planejado para que eu consiga tratar as pautas relevantes do cooperativismo de uma forma ainda mais intensa do que eu vinha fazendo até aqui”, planeja.


Esta matéria foi escrita por Tchérena Guimarães e está publicada na Edição 32 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação

Produto forte


Há mais de 30 anos no mercado de café industrializado, a Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé, no Sul de Minas Gerais, sempre foi uma grande exportadora. A partir de 2011, começou a investir mais fortemente no mercado nacional e na certificação de seus produtos. Hoje, tem marcas próprias de café em todas as categorias, do tradicional ao café em grãos e especial.


Culturalmente, o brasileiro toma muito café. É um produto forte, promissor e nós, cooperativistas, somos uma referência no assunto”, comenta o superintendente de Torrefação e Novos Negócios da Cooxupé, Mário Panhotta, um apaixonado pelo produto.


Com a chegada da pandemia, ele conta que houve a reversão da tendência, verificada há alguns anos, de aumento de consumo do café fora de casa.
“Antes da Covid-19, os cafés [estabelecimentos comerciais] estavam em alta, mas, com o isolamento social, eles perderam espaço e houve uma migração desse consumo de cafés especiais para dentro dos lares, especialmente por meio dos e-commerces", explica. De fato, no primeiro trimestre de 2021, os cafés em cápsula da Nestlé cresceram 17% nos Estados Unidos. Foi o melhor resultado dos últimos dez anos. No Brasil, o crescimento também foi de dois dígitos, mas a companhia não abriu os resultados no país.


Atenta ao crescimento do mercado de cafés especiais, a Cooxupé — assim como outras cooperativas — está apostando no segmento. Atualmente, ela comercializa três marcas: Evolutto, Prima Qualitá e Terraza. O Evolutto é o café torrado e moído tradicional, vendido em supermercados; o Terraza é um café em grãos, e o Prima Qualitá enquadra-se na categoria especial. Além disso, todos os produtos da cooperativa têm o selo de pureza da Abic e certificação internacional de segurança FSSC 22000, que atesta o monitoramento de riscos físicos, químicos e biológicos durante a produção.


Esta matéria foi escrita por Mariana Branco e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação